Três poemas de Carol Sanches
Carol Sanches nasceu em Campinas em 1981. Formada em publicidade e propaganda pela ESPM, possui pós-graduação em Poéticas Verbais pela USP. Atualmente trabalha com redação e produção de conteúdo para agências de comunicação. Tem poemas publicados nas revistas digitais Mallarmargens e Literatura&Fechadura, além de ter participado da Antologia Poética do Prêmio Sarau Brasil 2018. É autora dos livros independentes Poesias pormenores (2008) e Toda diva tem divã (2009). O livro Não me espere para jantar, que sairá pela editora Patuá em 2019, recebeu menção honrosa no Prêmio Maraã de Poesia 2018.
*
“despertar dos fundões da humanidade, algum tempo depois”
I
até o fim do dia
sua cabeça será soterrada
por quatro andares de terra
mas de tempos em tempos
a eternidade lhe assegura
um respiro
um passeio
num saco sujo
aproveite: estique todos os
ossos
deixados pelos vermes
sinta a brisa pelos furos
os soluços enquanto aguarda
seu lugar de volta
ao escuro
as saúvas sobem descontroladamente
e picam as viúvas
os pássaros fazem o coração
da tia Estela
palpitar nas pálpebras
o calor é, verdadeiramente,
insuportável
mas o passeio é seu
e de tempos em tempos
junto às moças que engordaram
e não foram reconhecidas pelos parentes
mais próximos
a eternidade lhe assegura
um respiro
um vizinho
um respiro
um vizinho
*
II
arrasta arrasta a pá pelos
andares de baixo a pá o
saco sujo o saco
sujo aguarda
imóvel
imutável
pesado
seu lugar
de volta
ao escuro
*
III
os demônios
precisam de nomes
apelidos não: nomes
formas de um fractal
se um demônio passar por toda a terra
incendiar os campos e
ignorar os desalentados
chame-o pelo nome
ele vai parar
ele vai olhar para trás
neste momento não o mire
por muito tempo
nos olhos encaramos
apenas forças equivalentes
deixe que o veja
através da corcunda
ossos e músculos
são escudos
quando não houver como vencer demônios
haverá sempre como
e sempre e como
chamá-lo pelo nome