Três poemas de Matheus Felipo
Matheus Felipo nasceu em 1986, no interior de São Paulo. É formado em História pela Unesp. Escreve, tira fotos de bonecos e faz malabares como hobby.
***
thundercats
cresci nos anos 90,
vendo os Thundercats
na TV. mas era entediante
a Cheetara, o Snarf e o herói Lion.
em contrapartida, eu ia ao parque
admirar a roda-gigante ruir.
explodia morteiro pra remodelar
a casa de um amigo que não queria
remodelá-la – ‘azar o seu’, eu sempre dizia.
saltava da cama-elástica contra
o ventilador ligado. mas até aí
normal. saltava de novo.
e de novo.
cresci nos anos 90,
vendo os Thundercats
destroçarem o Mummm-rá,
o que eu não entendi, já que
múmias são tão belas e legais.
fora isso, sonhava em ter
morte sofrida, afinal é o que
todo mundo quer um dia.
possuía um brinquedo que me fazia
a cabeça, a ponto de quebrá-lo,
só para deixar esquisito. aos domingos,
esperava acontecer uma coisa muito,
mas muito absurda, para que
eu voltasse a sorrir. os anos 90,
pelo menos pra mim,
não foram blasé.
*
escada
subo a escada
degrau por degrau
e não dois degraus
por vez
ou até mesmo
três
acho que assim
desfruto mais
a subida
cada degrau
é um sentimento único
cada degrau me faz
esquecer de como
eu era
antes de subi-lo
a escada finaliza
veja só
numa parede em branco
ao invés
de uma porta
que é monótona
só abre e fecha
uma parede em branco é genial:
vive os anos
estaticamente
sem entender
o que é ser estático
e faz silêncio
nos dias atuais
em que falar
parece mais respeitável
vou tocar a parede
e curtir o momento
depois descerei
degrau por degrau
a escada
*
craqueiro
chamo meu amor de craqueira
e ela me chama de craqueiro
é tão bonito
o crack nos une
o crack nos faz sentir o amor que falta hoje
vendi o mega-drive
os dvd’s do robô gigante
a belina 88
adesivada
cheia de brinquedos
agora disponho de níquel pra mais crack
quero consumi-lo
confiar que após a morte
há ets, universos paralelos
e narcóticos incríveis
minha craqueira
até furtar
ela furta
que legal, não?
na brisa, dialogamos sobre engradados
como são injustiçados
os engradados
ninguém se importa com eles
não sabem da onde vêm, pra onde vão, não há leis que os resguardam
coitados
ser engradado, no Brasil, é difícil
minha craqueira segura o cachimbo belamente.
espontânea
ensina os nossos filhos: ‘é importante segurar cachimbo’.
eu sou violento
irreversível naquilo que creio:
nas noias, somente nas noias.
Jesus, a bola de futebol, me diz: esférica, será sempre?
preciso saber
senão enlouqueço, faço selvageria, chacino em partes, sem dó.
Jesus, você não me respondeu!
vou enlouquecer, virei um gif animado.
o crack nos une
o crack nos faz sentir o amor que falta hoje