Três poemas de Pedro Eiras
Pedro Eiras nasceu no Porto em 1975. É autor de livros de poesia, ficção, teatro, ensaio. É Professor de Literatura Portuguesa na Universidade do Porto. Gosta de gatos, nuvens, sombras.
Os três poemas abaixo são inéditos.
***
Ameixa, mármore
Uma ameixa pousada sobre
uma placa de mármore.
Isto não é
uma natureza morta.
Na hora de apostar, vê:
a podridão acende por dentro,
queimando lentamente
polpa,
casca, caroço.
E a escura tinta, coberta
por um manto de fascinante algodão,
alastra sobre a pedra
progressiva.
Uma ferida, uma cicatriz
quebra o mármore,
sempre.
Tenho de mudar a minha vida.
*
Abandono
Entregas as chaves da casa,
definitivamente.
Uma porta engonçada no céu
roda de alto a baixo.
Uma casa é uma pedra de tempo,
fechada a toda a volta;
e é como se faltasse
uma letra no teu nome.
Vais dormir, um elefante branco
pousa no teu peito:
nas suas presas, os minutos longos
dos domingos,
enquanto esperavas,
para ir brincar lá fora,
que se dissolvesse
a tempestade.
A casa está fechada, o tempo
tem agora outro timbre, enfraquecido:
acordas com os olhos coroados
de pedras de sal.
*
Apontamento
Que sejas receptivo da alegria,
ou da dúvida mais rara.
Mas não carregues para sempre
esta tristeza funcionária.