Três poemas de Pedro Köberle
Pedro Köberle vive em São Paulo. Traduz e escreve poemas, cursa Letras-Inglês na Universidade de São Paulo. Teve poemas publicados na Revista Escamandro e seu livro de estreia está previsto para 2019.
***
Pastoral Casablanca-Rio d’Ouro
I.
No terceiro dia da festa do sacrifício quando
descemos em Casablanca. Quando eu e
você passamos na medina. Uma vez
que percebemos que o cheiro era aquele
de pelo e sangue de bicho queimando e ventos
secos. Muito bem,
já era tarde e as tripas secavam
estendidas entre meias e calças nos varais
atravessando as ruas.
As fibras curtindo no sol, chifres no chão
E a duzentos metros de altura emissões
de laser sentido Meca.
Quando vimos que não tem bem como
povoar a vista, enxertar, aqui e ali, uma
ou outra pertença.
Só um mármore verde,
você disse, que era o piso de um outro planeta.
II.
Um bicho feito de carne mole feita de planta.
Um boi feito, montado, do capim e do caule,
de xilema e floema tornados músculo e fibra.
Entre as plantas, cabeça de boi luzente.
E umas ancas imensas.
Chifres claros quando no fim da luz da tarde
um espetáculo manso numa extensão indiferente.
Naquilo que é exatamente
Contingente e por isso
fazendo trama, ali onde
“a paisagem inventa a vida”.
Insistindo que certos vegetais saibam cantar.
III.
Aqui dois cuidadores entram no cercado
para levar os animais
quase só com acenos.
As pontas dos rabos encharcadas de lama
Caindo em palmadas
nas costas das vacas.
Nas costas de touros,
figuramos
indo à guerra
armas em mãos
no tempo da confusão entre bicho melhor e gente menor.
*
E agora eu daria qualquer quantia
da massa do mar por um espaço
aberto
mas seco.
Você me diz que é pra seguir erguendo
pedra sobre pedra o mesmo edifício de antes
dispor em círculos pedras e pedras
e construir um jardim e uma fonte
mesmo que um dia a fonte
seja toda movediça de sapos
e minhas pérolas seus ovos.
– E um brilho de escamas no seu corpo na queda.
Não são lágrimas de crocodilo
mas cada lágrima um crocodilo próprio.
Você melhor que nós todos – menos ampla.
A água pra você menos fria.
O jardim se vê agora por periscópio.
As vontades de cima sejam feitas
mas preferia uma morte seca.
*
“…Without
Loneliness I should be more
Lonely, so I keep it”
– Marianne Moore
Ela parecendo tão pequena mas ainda assim
espalhando facilmente por aí todos aqueles
animais. Um elefante, alguns tatus bola, avestruzes,
pelicanos e aquele retrato famoso da Irlanda de
Spenser. Você é um estouro branco como
o interior do confessionário em Minas com
as tábuas azuis e rosa –
O confessor no meio suspenso suplicando
como num quadro ruim. Eu admiro mesmo
é o seu senso de humor seus pânicos e sua
vontade de limpeza. Como a solidão é tão
sua só porque é o seu tipo de sofrimento
e sua casa. Tão sem o que fazer sobre.
Tanto tempo pensando na sereia
se debatendo engolindo ar dobrada
debaixo do cais – as unhas gastas de tentar arrancar
marisco de uma pedra para comer – horrores.
Horrores, o que restou do cais parece uma cama
com postes altos e um dossel de teias
uma casa afundada, de sonhos.
É azul a clarividência da sua deidade
O seu tucano presente de aniversário
dos ex-administradores do zoológico
de Varsóvia come uma banana por hora
enquanto o seu “pior jardineiro desde
Caim” come menos e menos todos
os dias – os dois, de qualquer forma
tem os olhos azuis.
Os estalos das pinças dos caranguejos
mesmo quase inaudíveis sugerem uma
dança. Você encontra os restos das unhas
da sereia e diz essas são conchas
minúsculas quebradas contra as pedras.
Você chegou tarde, formou-se uma piscina na areia
onde antes pesava o corpo da sua sereia em convulsão.
J
Estonteante, uivos ao escritor!