Dois poemas de Fernanda Nali
Fernanda Nali fez sua estreia na prosa em 2018 com Território inominado (Editora Cousa), uma fusão entre ensaio e ficção de alta carga poética, que foi contemplado no prêmio de obras literárias do Espírito Santo. Atualmente, a autora reside em São Paulo, trabalhando numa tese de doutoramento em Literatura (Teoria Literária e Literatura Comparada, na USP).
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Fechar como se para a luz
na embocadura de abril
os olhos, ouvir um som
[por engano?]
a turba atenta à cor retinta
antes sentir-se na escuridão
e não ouvir menos que o último som
tiros de fuzil
oitenta
estivessem os ouvidos abertos
ainda o riso que porta e ostenta
o escusável medo
a violenta emoção
fechar-se como para luz
na carnadura de brasil
os raros sons.
*
Abrir os olhos como se soubesse
de dentro do mundo informe
em névoa, desperta o sono
ao som
[não por engano
essa pouca visão]
a sombra em seu favor
e não a luz
sem nada e antes o nada
com nada de matéria nas mãos
a horrível vergonha
Como um cão
Sim, como um cão
Mas tátil e sonora
Abrir-se como se à sombra
encontrar outra possível
forma.
(Crédito – Foto na home: Tom Boechat).