Dois poemas e quatro minicontos de Jussára C. Godinho
Jussára C. Godinho é licenciada em Letras Português e Espanhol, pós-graduada em Leitura e Produção Textual, funcionária pública, professora. Associada à AGES – Associação Gaúcha de Escritores; Membro Correspondente da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves de Porto Alegre, membro da União Brasileira de Trovadores de Caxias do Sul, Cônsul Poetas del Mundo de Caxias do Sul, entre outros. Premiações, classificações e participação em mais de cem antologias literárias. Autora dos livros Alma TROVAdora, volume 002 da Coleção Luiz Otávio é Cem, Porto Alegre, (2011); Meu UNIVeRSO a Poesia – Prêmio Herculano Vieira – Celeiro de Escritores – CELES SP (2012); Verde queremos ver-te (Editora Penalux, 2013), Para bons entendedores… MINICONTOS bastam! (Costelas Felinas, 2015), e Telhado de vidro (Editora Penalux – 2018). Blog: www.jussaracgodinho.blogspot.com.
Os poemas abaixo foram retirados de Telhado de vidro, e os minicontos de Para bons entendedores… MINICONTOS bastam!
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Pois é, Drummond, os tempos mudaram
Jonathan não amava
Daiana que ficava com
Michael que não amava
Thainá que não amava
Lucas que ficava com Jonathan e com Maiara
que ficava com todo mundo.
Jonathan foi para a parada gay,
Daiana, para a balada,
Michael, para a have,
Thainá para o luau,
Maiara… para a maternidade
e Lucas foi assassinado por Preguinho
que não tinha entrado na história.
(Poema vencedor do prêmio Lila Ripol 2018).
*
Lutas
Quando é, Cazuza Poeta,
Que “o dia vai ser feliz”?
Espero sentada
Cansada (Sensação intrusa).
Levanto e saio
Inspirada
A luta é a Musa, a Meta!
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Entre “aspas”
Ela amava além das medidas, era sonhadora…
Quando o conheceu, acreditou em príncipes azuis. Mas a geografia, o tempo e a vida os separaram durante muitos e longos, mas esperançosos anos. Quando o reencontrou, dizia ter a certeza de que “seu amor” “estava escrito nas estrelas”. Não sabia ela que esse “amor” estava “escrito mesmo era somente nas redes sociais”.
E num cinzento dia, ao abrir essa página de sua história, lá estava escrito: “conteúdo inexistente”.
Deu-se conta de que a vida a havia bloqueado.
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Infância perdida
Sua vidinha era fácil não! Enquanto outras da sua idade faziam tarefas escolares, passeavam no shopping, desfilavam mochilas da Barbie, brincavam no parque e dormiam cedo, ela brincava na rua, altas horas, com seu uniforme diário: microssaiinha, meia-calça furada, saltos altos carcomidos… E a bolsinha vermelha.
Fora engolida pela boca escancarada do sistema.
*
Caminhos tortuosos
Era um menino bonito. Era inteligente. Foi crescendo. Conhecendo gente. Um dia, os amigos lhe apresentaram um bonde. Pegou o bonde errado. Eles faziam de tudo. Não cheiravam o olor das flores. Não aspiravam a brisa da manhã, a fumaça impedia. A pedra que conheciam não era a de Drummond. Levavam objetos alheios. Sentavam à margem da vida. Já não era mais bonito. A inteligência se perdera nos bolsos furados.
Até que conheceu balas que não eram de hortelã.
*
Juízo final
Fechou os olhos. A vida veio em cenas como um filme. Arrependimentos explodiam em dores. Apertou os olhos, que nunca mais se abriram
Amor de verão
Os amarelos coloriam o ambiente. O pôr do sol invadia a janela entreaberta e se misturava ao amarelo perfumado das rosas, no centro da mesa, que testemunhava o cenário dourado daquele amor. Mas o outono chegou, e como suas folhas, o amor amarelou.