Três poemas de Maíra Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos, de Belo Horizonte, jornalista e escritora-poeta, mantém crônicas poéticas semanais no Jornal GGN, desde 2013. Em dezembro lançará Um quarto que fala, livro de poemas pela Editora Urutau.
Os poemas escritos em julho/agosto – inverno 2018.
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na mulher-poeta
há uma menina embalsamada
sua delicadeza se desfaz
quando é morta uma flor
no jardim cultivado
pela mulher-poeta
sem nunca abandonar
a dualidade
vida-e-morte contidas:
nos tempos de trabalho
da palavra escrita
nos acontecimentos
do mundo material:
a flor viva
a flor morta
na enlaçada mulher-poeta
a ilusão de preservar
o que jamais será eterno:
apenas pode-se o jardim.
*
somos sempre muito mais do que dois
há entre nós esta janela
que se aterrissa melhor antes das oito da manhã
é importante ter sapatos duráveis ou assuma a espiritualidade
dos pés descalços
ah!
também isso há entre nós os modos discrepantes
das sobriedades
nem sempre os mesmos conselhos
ao atravessar as ruas amarelas e azuis os lados
estão muito distantes não intuiria voltar a ler fascismo
nos jornais aqui diariamente entregues: cep 30280-080
também isso há entre nós o código do país
é importante para revelações monásticas ou demoníacas
embora se pareçam tanto às vezes
– Tolstói abandonou tudo e foi silenciar diante do mundo
descalço
subir as montanhas mais altas:
você gosta dos pés livres ou vai continuar a vestir sapatos?
também isso há entre nós as decisões
ainda que eu mesma mulher-livre converse e me deleite
com quem escolhe calçar sapatos e ainda assim continuar a olhar
tudo mais que há entre nós.
*
I
…o céu
está cinza demais
duplicado nesta cor
não sei dizer os nomes
em minha estrela.
II
a costura dos desejos
livres se posicionam em altivez
a linha a agulha sobem
como se alcançassem a imensidão
dos pontos-do-céu de cada estrela
para entrar e alinhavar
e a artesã voltar a repetir
estando envolta neste claro-escuro
…o céu
está cinza demais
ficará escrito o que de mim?
é cinza.
estas mãos, como se cansam
para às vezes nada ver e nomear:
assim acumulam-se os desejos.