Três poemas de Michel Peres
Michel Peres é professor, leitor e escritor. Natural de Matozinhos (MG), escreveu poesias que nunca passaram pelo crivo da gaveta e vive a desenvolver a sua mitologia pessoal (divertindo-se bastante com isso). Escreveu para o site Obvious e já teve contos publicados no site Leitor Cabuloso e nas revistas Trasgo e Somnium.
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Docimásia da democracia
Pulmão afunda ou flutua?
Há bactérias no estômago? Resto de
leite? comida?
Pré-sal é prensa, é acordo
Acorda pra vida
pra noite
feito homem
feito branco
feudo fakkk news
feto
nati
nazi
morto.
*
Viaduto sacro
este viaduto
fincado na confusão da
avenida Cristiano Machado
acaba por dividir
o ir
do vir
até a casa daquela moça.
o que me faz perguntar
como anda aquela esquina
daquela rua estranha
onde
os carros parecem dormir
nos muros das casas
os arames respirar
e o café está sempre pronto.
porém, estranho mesmo é
como as coisas se impregnam de gente
e como as coisas se impregnam na gente
a ponto de um pedaço de nada
tornar-se infalível ímã
puxando o olhar
exemplo é aquele santuário
de Nossa Senhora do Carmo chamado
pelo povo e guias da cidade
levantado por escuras mãos
em algum ano
após 1784
representante exemplar
do barroco mineiro
rococó imponente
mas que,
também,
fica ao lado da sua casa.
ou aquele copo
antes cheio
de pimentas da cidade Natal –
afirmam ser linda –
que sapecaram por três meses
o arroz com feijão.
hoje não há pimentas
há canetas
passando para o papel
o ardido de uma azia
semirresolvida
em algum canto
entre 2004 e 2011.
*
Macacóvski
Como borracha
Minha barriga infla.
As unhas se tornam cascos.
Toda manhã, em vez de olhos,
Tenho duas brasas faiscantes.
Pelos brotam como
Erva daninha
Orelha
Nariz
Lóbulo
Peito
E dedão.
No sorriso, uma mina de ouro,
De tolo.
O rosto,
Vermelho-cachaça,
Briga com o tempo.
Rusgas a cada momento.
Sou homem
ou
Sou floresta?
Não importa.
Com voz rouca vou
Seboso
Em meus vinte e nove anos.