Sete poemas de Lorena Clarice
Lorena Clarice é natural do interior da Ba, nascida e residente na zona rural do município de Riachão do Jacuípe. Menina -mulher, poetisa e cordelista em construção, risonha, capricorniana; que não teme externar seus sentimentos, é coautora de algumas grandes antologias, revistas e coletâneas poéticas. Por meio dos versos, revira a vida em novas percepções, re (construindo) escrevivências.
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AINDA SOU EU
Sou eu ainda,
mesmo com tantas mudanças.
Não me estranhe, ou, estranhe (…)
mas, repare minhas semelhanças.
Em todas que fui eu,
todas deixam um rastro.
A criança, a menina, a moça
e a mulher que me toma de alastro.
Tudo em mim, é tempo.
Tempo é casa;
Tempo corre, casa fica
eu crio asa.
Viva as dores e delícias
que constroem-me;
mulher.
Viva aos meus erros e acertos que fazem -me;
ser o que quiser.
*
MIRANTE RELICÁRIO
Brevemente as folhas se acenam,
debaixo do frondoso cajueiro.
A brisa é leve, o céu nublado
e o raio de sol é certeiro.
O tempo corre dentro do olhar
e no jeito da criança andar,
porque tudo é passageiro.
Olhar a vida passando,
é o choque primeiro.
Sentir a vida perdendo espaço,
é o toque derradeiro.
Ter o tempo pausado
já que é conjugado,
do genitor ao herdeiro.
Em minha frente, as crianças
me abrem uma memória;
o tempo pausa nos meus olhos
para retornar em certa história.
Atrás de mim,
com cheiro de alecrim
a minha criança em glória.
Tudo me enche os olhos,
principalmente, de saudade.
A sina acontece dentro da vida
revirando sua totalidade.
Já que tudo é provisório,
pois, tudo é ilusório
do amanhecer ao fim de tarde.
Todos os mistérios da vida
estão no mistério da morte.
Tudo que é caos
tudo que é cais,
até mesmo quando se é percebida
a desen (sorte).
*
O des(cansar) da aorta
E se a aorta se cansar,
e o fluxo quentinho não percorrer?
E se ela for descansar,
e você tiver que adormercer?
E esse tão esperado “amanhã”,
e os planos & metas?
Pera! sem café da manhã,
sem família, sem festas?
Oi? e isso tudo aqui,
tudo isso que almejo?
O que resultará se eu partir,
sem ao menos fazer o que planejo?
Sem ter-me mais,
sem ter nada sentimentalmente…
Sem ter toques carnais,
sem ter nada materialmente…
Sem ter quem eu tive,
sem estar onde eu quis…
Sem sentir o que mantive,
sem saber se fui feliz…
Sem ter mesmo a aorta,
que já está se cansando
agora quase morta,
menos um bip: parando…
Aorta, reage
Aorta, é cedo!
Aorta, me devolve
Aorta, eu tenho medo!
Calculo os últimos instantes
e a aorta sorri
são estados diferentes:
ela dorme, e eu morri.
*
POR ORA, JÁ QUE É SEMPRE TODA VEZ
Por ora, quero voz
Já que toda vez é do outro.
Por ora, quero ser eu:
Eu- livre, eu-minha, eu- do meu gosto.
Por ora, cantar o que não é cantada
Por ora, contar o que não é piada..
Sem paradigmas: no corpo e rosto.
Por ora, pelo menos
Quero sentir o gostinho do prazer..
Das delícias, de deliciar-me
Na liberdade do meu ser.
Por ora, vestir-me como quero
Sem temer o que sempre espero
Nas vielas cotidianas do viver.
Por ora, cantar a minha canção
Seguir os meus instintos.
Por ora, dançar sozinha
Sem rodeio de olhos famintos.
Por ora, poder ecoar
Minha voz e o que eu desejar,
Já que toda vez são retintos.
Toda vez é o mesmo grito: mudo.
Toda vez é a mesma mordaça.
Toda vez são as mãos grossas,
Dilapidando corpo e carcaça.
Toda vez é choro oculto
Do “não pode sair sem grupo”,
Toda vez é a mesma desgraça.
Toda vez acontece,
E não importa o lugar!
Toda vez na rua,
Toda vez dentro do lar.
Toda vez na universidade,
Toda vez na maternidade,
Toda vez conseguem se safar.
*
SERIGUELA TEM GOSTO DE QUÊ?
Toda tarde de domingo,
minha retina é invadida…
Não que de segunda à sábado,
eu não tenha a mesma visita.
Mas aos domingos,
tudo é mais saudoso!
Tudo é perto da lágrima,
tudo é mais espaçoso.
Meus olhos respingão,
minha boca saliva…
É o gosto da seriguela madura,
é o cheiro de vovó em vida.
É o olhar sereno & peito apertado,
são as doces memórias afetivas
de tom vermelho alaranjado,
é a saudade travosa das partidas.
SUTURADA
Escrever é sempre dor
de rasgar o peito (…)
Suturar, e aguardar que cole
com afeto e respeito.
Escrever precisa ser do avesso,
igual remendo.
Vai se tornando guia
e protegendo.
Escrever é um ato cortante,
que me retalha em papel.
Corto à mim- ao que sinto
e nada vai para o céu.
Escrever é gestar palavras,
é parir versos…
É ser poesia solta
e gerar novos uni(versos).
Escrever revira o mundo,
e o mundo é em mim.
Além do que os olhos veem,
escrever é sem fim.
*
TRIZ
A gente quase foi
e faltou bem pouco.
Um milésimo centésimo
de cratera entre um & outro.
Nos curvamos,
aos quereres carnais.
Nos cruzamos,
em hipócritas estéticas banais.
Queríamos,
a vida toda liberta (…)
fazíamos,
na prática outra métrica.
A gente se teve
e por instantes isso bastava.
A gente foi fundo,
mesmo sem saber onde mergulhava.
hudson romério
Boa noite! quero parabenizar a poetiza Lorena Clarice, gostei muito dos seus poemas!!! SÃO MUITOS BELAS E SINGELOS!!!
VIVA A POESIA.
VIVA O SORRISO SIMPLES DESSA GAROTA LINDA!!!
Hudson romério
brasília – df