8ª Mostra CineCaos: “A Nós, Solitários” (2022) – Por Antonio Cuyabano Jr.
A Nós, Solitários. Direção: Guilherme de Oliveira. País de Origem: Brasil, 2022.
Como descrever o silêncio? Uma forma simples de se manter quieto diante das situações cotidianas, ou o desgaste, preguiça de comunicar-se? A questão é que chega um momento da vida que é melhor refletir do que verbalizar. A partir disso o social se perde e nos acostumamos cada vez mais com nós mesmos, permitindo-se aproveitar da nossa própria companhia. Enfim, solitário.
O curta inicialmente levanta questões sobre como a solidão é uma forma de expressão. Nesse sentido, acompanhamos uma jovem que aproveita a vida nas pequenas interações que lhe aparecem. Ligado por um fio condutor bem próprio ao cinema francês, A Nós, Solitários expõe suas representações, sejam pela própria estética, seja pela identidade. Desse modo, a aproximação para com os filmes de Godard deixa bem claro a intenção do realizador para aquela diegese, ou seja, propor uma relação entre personagem e ambientação. A protagonista, por sua vez, encara aquele espaço de maneira introspectiva, marcado pelas suas risadas em frente à televisão ou gestos únicos e constantes naquele ambiente que nunca para.
A partir disso, observamos um desgaste comunicacional, que nos permite entender, até que positivamente, o porquê desse comportamento. O fato de a protagonista estar aproveitando o momento de forma única, contribui para um olhar mais externo do que interno, gerando um contraste. Ela anda pelas ruas, para, corre, dança. O principal personagem com qual ela interage, é ela mesma naquele espaço. O caos da cidade que nunca para parece mais pendente do que as próprias reflexões. Nesse sentido, há uma crítica forte em torno da mecanização humana e o seu respectivo esgotamento emocional. A narrativa fortalece a forma introspectiva de reação ao ambiente, como forma de diferenciação entre os demais. Ainda que possa constatar de uma consequência.
A cidade torna-se um ambiente dinâmico e muito prático, que rasga relações humanas. O isolamento da personagem é identificado como uma expressão de liberdade, ela dança sozinha, com uma música que somente ela compreende. A propósito, esse momento retoma a uma discussão já proposta, a de como a companhia interna pode servir como tratamento emocional. Por meio da dança solitária, observamos a aproximação do curta com outro filme, Lagosta (2015). Em um ambiente onde há repressão do afeto, dançar conforme a música se torna a melhor opção.
Além disso, cabe salientar o silêncio nesses momentos, que, por mais que seja perturbador, indica sua real intenção. A partir disso, relacionamo-nos novamente com o próprio cinema francês, através do filme Banda à parte (1964), que, além de expor a relação dos personagens com o ambiente da cidade, cria dinâmicas e brincadeiras com a arte cinematográfica.
O solitário já foi representado como algo egoísta ou até comovente em outras obras audiovisuais. Neste curta, há uma outra forma de expressão, que consiste em trazer o melancólico como parte pertencente da natureza humana e que precisa ser sentido e compreendido. Visualizar o copo meio cheio ou simplesmente derramá-lo para observar como um copo vazio.
* Texto escrito a partir da programação da 8ª Mostra CineCaos (Cuiabá-MT), exibida online e gratuitamente no serviço de streaming brasileiro Darkflix no período de 01 a 10 de maio de 2023.
** Antonio Cuyabano Jr. Cuyabano apenas no nome, natural de Caçapava. Formado em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal de Mato Grosso. Escritor e realizador cinematográfico.