Antologia Slam do Capim Xeroso – Uma poesia de Sol Ferreira
Nesta sexta feira, damos seguimento a nossa Antologia do Slam do Capim Xeroso na Ruído Manifesto. Sabemos que em meio à crise sanitária no país, ficou difícil estabelecer relações da cultura do Slam com a rua. Indo das periferias da cidade até o centro, poetas se articulavam pra aderir a esse movimento e recitar seus versos no Beco do Candeeiro. Nossas atividades ainda não retomaram como grupo, porém, cada artista desse segmento apresentará a cada 15 dias um pouco de sua ginga com as palavras. Hoje, o segundo round é com o poeta Sol. Seja bem-vindo Sol! Vida longa à Poesia de Rua!!!
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Sol é mato-grossense, nasceu em Cuiabá e mora em Várzea Grande. Tem 21 anos. Se reivindica-se como pessoa trans não-binária. Tem formação em Teatro, com ênfase em atuação, pela Universidade do Estado de Mato Grosso. É graduando de Letras – Português e Literatura pela UFMT. Fez intercâmbio e residiu em São Paulo para estudar na SP Escola de Teatro. É integrante da Coletiva Slam do Capim Xeroso. Nas artes plásticas, seus trabalhos perpassam pelos temas: Necropolítica, gênero e sexualidade e regionalismos. A reciclagem é a técnica mais presente em suas manifestações.
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Xas creança tão armada cas palavra
Catorze e tão de corre na pista
Escrevendo poesia, mandando rima
Denunciando colega racista e tio machista
Já nasceram fazendo uma pá
São poetas, estetas, vendedores de suquinho pa ajudar as mãe a comprar o pão e o leite dos irmão
São só criança também, mas são uns puto duns artista q ainda consegue ser secundarista Esses menó, desde a hora de nascer, já sabe que pode morrer
Bozo, Bozo, Bozo, Bozo da cara branca, que pega essa criança e mata Bozo da cara Branca ta ensinando pas criança q assassinato no Brasil é rotina Que é 1 preto, há cada 23 minuto morrendo na esquina
Que mulher é uma a cada duas horas
E trans é todo dia, sem falha, na ponta da navalha
Que índio a gente atropela com esse patriarcado de merda
Ao invés de da livros pra gente estuda, mandou liberar a posse de arma pra gente se mata
Os jovens tão se matando, pq tão matando os jovens
“Ah, mas eu preciso de arma pra igualar minha força com a força do ladrão” Ô cê ta lokão? Ladrão aqui, só se for de ladrão de coração
“Ah, mas é defesa pessoal”
Bala q só acerta preto vc não pode chamar de defesa pessoal, chama de bacanal, da porra que ce quisé
Não é legítima defesa quando cê entra no beco e mata 3, que agora tão ali na estátua pra recordação doceis
Cara, eu to cansada de discurso fácil
De quem acha mais fácil resolver com prisão, do que com educação Discurso de quem diz q mérito não se discute
Seus bando de Bettina, bumbum de iogurte
Discurso de quem veste a farda e anda por ai fazendo a Alice, no país das maravilhas Enquanto aqui, só dá Alice no país que mais mata travesti, 111 tiros e chapeuzinho vermelho de sangue que escorre da cabeça
Xas Creança, eu sei q ceis tão ligado, q essa é a verdadeira face dos conto de fada Mas, é possível fazer revolução
Ser menó artista, na pista
Ser gente de sorte, de corre, corre, corre das milícia
Pra mostrar q enquanto continuam a tirar 30% da educação
Seguimos de caneta e papel na mão
Em porte de livros
Pra mostrar pros nossos filhos que
Xas creança, tão armada cas palavra.
-Sol.