Cinco poemas de Júlia Vita
Júlia Vita é artista e poeta formada em Artes pela UFF. Em 2019 lançou seu primeiro livro de poemas, Alga Viva.
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Verbo rubro
Minha avó do batom ensinou-me o gesto
E agora eu, quando o pego,
faço – quando empunho o batom, o bato
Assim tenho a porrada do vermelho e não
o vermelho que passa
Ensinou-me o mesmo do blush:
não a passagem, a batida
A maquiagem não é para o vão defeito
mas a cor
no rosto que se violentou e foi violado –
e por ela mesma faz tal fato diminuto
– a cor, a cor
do momento
E basto.
*
Uma alga viva:
alguém mete as mãos
e ela foge
ou ela gruda
e sentem
nojo
Como alga viva, mãe?
primeiro desista da palavra
força
logo depois da resistência.
Um corpo resistente
é destruído fácil
por quebradiço
Logo depois exercite o drible:
algo esbarra, se desvie
ou abra buraco
para que passe
Seja peixe, porém
não morda
iscas.
*
Gosto muito do cheiro dela, molhada.
E do visgo a depender do período
e do musgo
a depender do zinco
Por abertos cílios e ganas púrpuras
vemo-nos,
as duas, pela líquida raiz maldita
que é alga e carmina o germe
Azul, podre e amarelo
o sol século brônzeo grampeando
artilharia
menos antiga que esbelta
E com água Imbuhyda desta
Ao ponto de criar saliva
quando ao longo, oito redemoinhos – entradas
expulsivas – na beira
A depender do lapso, lavada
e cheia, Guanabara altiva – viva, viva
*
Não é espelho o que se vê
para dentro (lagoa)
Nem só água o marco do zelo
A brânquia, o caranguejo
a garça na proa do braço estanca
o voo fortuito batendo asas,
polvilhando sais, removendo
o lodo das bárbulas salobras
Vulnerável ao musgo,
o tempo afinal perdura
Em seu pecado nativo respira
assembleia, sofás e utensílios
sem vida elétrica cujos fios de bronze
afiam bocas carcadas na carniça
Um crustáceo escala o vergalhão
fincado no charco
Uma menina ancorada
busca a ponte – ante a ferrugem,
o lado marinho
e pescadores subindo suas linhas
Macio, o nylon na carretilha
compreende a geografia do chão
traçando a diferença de areia
na rede emalhada: a graça do pano
quando pouco esse coar saneia
Risco do banho, tragédia da falta:
a sede resseca, porém mais bela
a menina volta filmando
em panorama.
*
Depois de todas as avós
morrerem
os avôs olham para o mar
e dizem
nossa, o mar ainda está violenta
e riem ajeitando o erro
antes de outro som de sim,
violeta!
Uma criança sem blusa
corre traçando círculos
ao som de um pai que diz
te amo com raiva
e mergulha na ira
e uma criança ri muito
ajeitando os erros
construindo círculos
Um barco pesqueiro com
quatro cabeças passa por trás
o amor com raiva supera
a água e a cabeça vira
Em cima assistindo
ao mar violenta com neblina
por trás da raiva do amor,
do avô e do círculo
treze caravelas,
uma imagem de época