Dez poemas de Larissa de Almeida Corrêa
Larissa de Almeida Corrêa nasceu em São Paulo/SP, em 1991, e reside em Curitiba/PR desde 1997. Formou-se em Direito pela PUCPR e trabalhou de 2014 a 2022 no Ministério Público do Estado do Paraná. Pós-graduada em Direito Penal e Criminologia e pós-graduada em Direito Público, é envolvida com pesquisas na área de criminologia e feminismo. Também é graduanda em História e se interessa pelo estudo da articulação entre a escrita de autoria feminina contemporânea e a sociedade brasileira. Desde 2022, participa de várias antologias de poemas. Sol e Sopro: devaneios em poemas é seu livro de estreia.
***
Casa do Sol
folhas longínquas
perto de mim
manto de sol
chuvas de jasmim
na rotação do girassol
que segue meu coração
[imperfeição é licença para renascer]
sol que na pureza
idílica
em sua casa de céu matinal
mistério mágico
delírios atávicos [eu e você]
da alvorada que veste o céu
na encantada partida
no jardim de margaridas
porém, prefiro as idas
pulsantes do vento
que varre o silêncio
daquele momento
esculpido pela estação
– Minha transformação.
*
Querido Gray
uma pintura eterniza a rima
ou a ruína
da alma que
nos calmos sentidos
assassinou a voluptuosidade
esmagada pelo peso
do ruído flácido
daquela imagem.
um homem só
é metáfora das suas angústias
ou do que basta de si.
*
Desenhando conversas
Esculturais montanhas
lá de longe as vejo
ornamentada pelo desejo
de conversar com o céu
tão altas, a mim inacessíveis
tento apalpá-las com os dedos de sol
que no ar desenham seus gracejos
no cume do homem deitado
no leve frescor que sorri
ao beijar a nuvem
do pico mais alto
*
Lagos de sombra
Quantas sombras fui?
quantas de mim foram sombras?
penumbras da alma antiga
versões amigas
inimigas [perseguidas]
cálidos beijos
pálidos passos
quantos lagos de sombra
habitam em mim?
mística métrica
sem rima, sem sentido
quantas de mim são réplicas
de gritos não ouvidos?
*
Eu, elementar
Eu
múltiplas escritas
de mim [elementar
nadando na terra
calçando o mar]
afogo versos
no som do ar
inspirando corpos
expirando almas
no pulmão fogo
e no coração terra
onde
– Você insiste em pisar!
*
Mora dores
toda vez
que eu vejo uma casa antiga
fico pensando:
– quantas eram as saídas?
fico pensando
se portas batiam
e se janelas sorriam
nos jantares dissolutos
na mesa da sala
[reuniões: pessoas em suas várias versões]
fico pensando:
– quais (in)cômodos acomodavam as dores?
e se no quarto houve um parto
e se ruínas nascentes
amordaçaram uma mulher.
penso nas vaidosas maldades
embebidas de afeto
de semblantes das idades
– em qual morada moram as dores?
– para debaixo de qual tapete
se varre as sujeiras dos sonhos?
– em qual espelho empoeirado
moravam as dores
dos moradores?
*
Saudosa sombra
Fim de tarde
caminhando sob o sol
ela se despe de si
e da sua sombra
já não é perseguida por si mesma
sem a sombra cega
mutilada pela claridade
a sombra ausente
leva consigo
o ser dúbio
duplamente só
mas, ao mesmo tempo,
uno.
sente saudades da sombra
e da ilusão de si mesma
solitariamente de mãos dadas
com as interferências que
reluzem
[bloqueios propiciam a nitidez]
– Enfim, sozinha!
mais uma vez.
*
Tempos de mim
Meu corpo
templo de túmulos
de várias de mim
despertas
embaladas nas canções
das marchas fúnebres
de sentimentos recitados
festivais de tempos meus
eu, a sorrir dentro de mim
pelo que não fui
pelo que fui
pelas várias que sou
s o a n d o
não serei/sem saber
até que eu seja A outra
sendo A mesma
de várias de mim.
*
Sal
lágrimas de sal
deixe que
conservem e ceguem
os ouvidos.
*
Sol e Sopro
ela passeia e borda
seu nome num flerte de linhas
tão claras
incessantemente jogadas
tão facilmente
ele
pegou o trem e na bagagem
a imagem
refletiu nela
feita de sol e sopro
pra te amar de novo
olha para mim
olha
para
mim
olha…
e na estação parava
num adeus entregava
a sua memória
rascunhou a vitória.
e perdeu seus escritos
num ato soma o grito
e a espera
singela
do adeus dela
feita de sol e sopro
pra te amar de novo.