Especial Mulherio das Letras Indígenas: Vanessa Guarani Ratton
Vanessa Guarani Ratton. Professora, jornalista, poeta, dramaturga, cronista e autora de literatura infantil e juvenil.
Vanessa Ratton já usou o pseudônimo Tatá Bloom, e também é conhecida como Vanessa Guarani.
É formada em Letras e mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC -SP, especialista em Teatro Brasileiro, Psicopedagogia e Justiça Restaurativa e Cultura de Paz.
Foi finalista do Prêmio Nelly Novaes Coelho 22 pela União Brasileira dos Escritores (UBE) e USP e finalista do Prêmio Barco a Vapor 23.
Tem obras selecionadas pelo PNLD do MEC, nos anos de 2021, 2022, 2023 e 2024.
É diretora da UBE e integra a Comissão do Plano Nacional do Livro e da Leitura.
Suas obras são: Encontros à Hora Morta (Florear Livros), em parceria com Maria Valéria Rezende, Quando a Lua é Cheia (Pantograf), Uma menina detetive (Bambolê), A menina que engoliu uma rima (Florear Livros), O ratinho que não gostava de queijo (Amare). Tem participação em diversas coletâneas, entre elas, Contos de Pindorama (Amare/Mulherio das Letras Indígenas), Ali Gagá e os 40 gatões (Amare), Histórias (mal) cheirosas (Trejuli) e Contos com os pés na Terra (Pó de Estrelas).
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Vanessa Guarani Ratton: sobre sua trajetória e a importância do Mulherio das Letras Indígenas
O Mulherio das Letras Indígenas nasceu em 2020, por idealização da escritora indígena Eva Potiguara após uma conversa com a escritora Maria Valéria Rezende, uma das idealizadoras do movimento nacional Mulherio das Letras, que surgiu em 2017. Valéria indicou a escritora e articuladora nacional do Movimento Vanessa Ratton para apoiar Eva nessa missão.
“Para mim, foi um momento muito significativo em.minha vida, pois estar junto com mulheres Indígenas de todo o país foi como resgatar meu passado, pois sou bisneta de Guarani de Bertioga, litoral de São Paulo. Metade da minha descendência é indígena (Guarani- Bororo) e a outra italiano-espanhol. Hoje, estou fazendo minha retomada, me aproximei da aldeia e aprendo a cultura. As manas indígenas me ensinam muito “, afirma Vanessa.
O mais interessante é que ela afirma que sempre se sentiu diferente, principalmente, quando pequena, pois falava com o mar e com o vento. “É um chamado do coração. Minha avó era benzedeira e herdei dela esses conhecimento de rezas e chás. Se você ler meus textos, mesmo antes de iniciar minha retomada você vai ver o respeito aos indígenas, a denúncia da exploração e falta de cuidado com o meio ambiente”.
Vanessa diz que, se perguntarem hoje como ela se sente, diria que é muito mais indígena do que europeia, um continente que não conheceu. “Meu modo de vida é o bem viver. Minha mãe é a mãe terra”.
Indígena em retomada, ela diz que não tem como esquecer sua criação na cidade, então, ela acredita que assim como muitos pardos, que são descendentes de indígenas, de mulheres roubadas, estupradas e silenciadas, sua missão é tentar fazer com que os brancos entendam melhor o modo de vida dos povos originários e que respeitem mais o meio ambiente.
“Minha bisavó foi sequestrada da aldeia aos três anos de idade e sua cultura e sua língua foram apagadas. É minha culpa ter nascido na cidade e ter os conhecimentos ancestrais roubados de mim? Não. Mas preciso reaprender tudo isso e usar da melhor forma possível para contribuir com meu povo. Tenho feito isso levando muitos estudantes para conhecerem a vida na aldeia e procurando ajudar meus parentes a obterem seus direitos e recursos para melhorarem a vida através de projetos culturais.
O Mulherio das Letras abriu meus caminhos para o mundo da Literatura. Sou muito grata ao movimento, para mim, o maior movimento literário, desde a Semana de 22. Um movimento que deu visibilidade à autoria feminina. De uma importância gigante.
O Mulherio das Letras Indígenas nasceu dentro do movimento, mas já tomou uma proporção maior. Também somos nacional, além de dar visibilidade para uma centena de escritoras indígenas, publicamos o primeiro livro que traz um registro biográfico dessas mulheres, povos ao qual pertencem, localização e contato.
O Álbum Guerreiras da Ancestralidade foi ganhador do Prêmio Jabuti 2023, na categoria Fomento à Leitura. Projeto criado por Eva Potiguara e editado e publicado pela minha editora, a Amare, que nasceu para publicar as obras do Mulherio das Letras e hoje virou minha segunda carreira, como editora.”
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Mãe Terra
Yeba Buro, avó do mundo,
Arquiteta do mundo terrestre,
Ensina ao povo desta Terra:
Que a água tudo limpa
Que o fogo tudo transforma
Que o vento tudo clareia
Que a Terra tudo molda.
Mãe Terra, primeira mulher Indígena,
Protetora da Natureza,
Ensina ao povo desta Terra:
Que o mundo é um útero de mulher
Que cuidar da mãe Terra é
Tudo o que o Indígena quer.
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É belo o futuro?
Cadê a mata que tava aqui?
O fogo queimou.
Cadê os animais que estavam aqui?
O homem caçou.
Cadê a água que caiu com a chuva?
A terra bebeu.
Cadê o igarapé que se formou aqui?
O rio levou.
Cadê o rio que estava aqui?
Belo Monte represou.
Cadê a rocha que estava aqui?
A dinamite partiu.
Cadê a energia que estava aqui?
A eletricidade gastou.
Cadê a vida que pulsava aqui?
A ganância matou.
Cadê a humanidade que havia aqui?
O dinheiro comprou.
E cadê os homens que armaram essa guerra?
Mãe Natureza levou pra terra.
Cuidado, a morte tem um nome Belo
e em cima do Monte, existe uma Alta Mira, por onde enxergamos que, de repente, numa manhã, pode não existir mais o nosso amanhã.
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Mulher, corpo e território
Mulher,
Corpo e Território
Mulher,
Herança de saberes
Mulher,
Ancestralidade e deveres.
Mulher,
Quando tu nasces,
és parte da mãe terra
Que expandes
Mulher,
Corpo político
conhecimento forjado
no convívio da comunidade
seja na aldeia ou cidade.
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Sobre Viver ou Sobreviver?
Comida ou sobra pra viver.
Se tem gente com fome, dá de comer.
Esperança é sobre viver.
Se tem gente com fome? Dá de comer!
Luto ou sobrevida é de doer.
Se te gente com fome… dá de comer…
Indignação nos faz só bem viver.
Se tem gente com… fome! Dá de comer?
O outro é digno de só sobreviver?
Se tem? Gente com fome… Dá! De comê.
Na escolha de só com brio viver…
Se tem gente com fome, dá de comer…
Ouve meu clamor, é sobre viver:
Se tem… gente? Com fome, dá de comer!
Resiliência é sóbrio viver.
Se tem gente com: fome. Dá de comer.
Invisíveis não sonham sobre viver.
Se tem gente com fome: DÁ DE COMER!!!!
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Lançamento infantojuvenil:
Contos Indígenas de Pindorama
Textos de Amanda Simpatia, Cláudia Flor D’ Maria, Eva Potiguara, Lucia Tucuju, Nora Pimentel e Vanessa Guarani.
Ilustrações Wera Marques
R$60,00
Potyra Terena
Muito importante os escritos do Mulherio das Letras Indígenas, porque mostra a força e a resistência da ancestralidade.
Parabéns!