Oito poemas de Camila Koenigstein
Camila Koenigstein é uma paulista com traços portenhos. Mudou-se para Buenos Aires buscando encontrar o caminho do equilíbrio e se perdeu.
Graduada em História pela Pontifícia Universidade Católica – SP e pós-graduada em Sociopsicologia pela Fundação de Sociologia e Política – SP.
Atualmente faz Mestrado na Universidade de Buenos Aires (UBA).
Colaboradora da Agência latino América de información e do Jornal Resumen latinoamericano e Jornal GGN.
Colunista do portal de notícias Pragmatismo Político.
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Descrença
Não acredito
No mel que escorre de algumas bocas
Nas palavras que saem fáceis demais
Nas carícias sem medo
No olhar sem timidez.
Não acredito
Em quem não silencia nunca
Em olhos que não enchem de água sem razão
Em mãos que não tremem depois de muito tempo sem sentir um corpo.
Não acredito
Em amores fáceis
Em pessoas descomplicadas
Em quem não tem dívida
[com os outros ou consigo]
Não acredito
Em quem nunca carregou um fardo
Em quem não tem inimigos
Em quem não fez estragos
Não acredito
Em quem nunca cometeu o grande equívoco
de ter o coração destruindo
mas seguir amando com o que sobrou.
*
Volume e Massa
Eu te amei
Quando você não existia.
Quando era uma ideia
[imaginação]
Sobre o que era o amor.
Hoje você existe,
mas detesto o que inventei
dentro do meu cérebro atormentado.
Pena que não foi um desenho
Um rabisco no papel
Poderia jogar fora e refazer.
Não, te criei com densidade
[volume e massa]
Tão real que tem vida própria.
Agora você vive e eu morro.
*
Proteção
Queria ser minha masmorra
Para me trancar
Para não deixar nada entrar
Principalmente a esperança
Que sempre move tudo
Engana o mundo
faz estragos
Gera moribundos
Por onde passa, destrói tudo.
*
Tempo
Meus vizinhos partiram
[Minha mãe segue]
O tempo passou rápido
Pouco percebi
Que tudo mudou
Mas segue parecido.
Minha infância sofrida
[Já não é infância]
A vida corre, não sei pra onde
Acompanho o que consigo
Sinto falta de ar
Transpiro
Sou o que resta
Daquela época triste
Que parecia uma festa.
*
Modismos
Há moda e remédio para tudo
Perfumes que imitam o cheiro genuíno da pele
Fragrância que extirpa o cheiro da vagina
[o que Baudelaire diria?]
Remédios para ereção [falsa] masculina
Hormônios para não sofrer
Botox para rejuvenescer
Há moda para escrever
Rítmica e métrica
O passado já não interessa
Nossos mestres não tinham antídoto
[creio mais neles]
Há mais verdade quando não existe saída
Hoje tudo é ditado
Catalogado e estudado
Até mesmo os sentimentos
Tanto medo do fim que vivemos nos deformando até o destino final
Um desespero que antes os poetas sabiam lidar,
por isso aliviavam a dor dos que não podiam se expressar.
A verdade?
A vida segue indigesta, mas andamos com um Eno no bolso, digerindo artificialmente os desgostos.
*
Sabedoria
Um vaga lume na escuridão
O macaco pendurado num pequeno galho frágil
Formigas que sobrevivem aos trovões
Borboletas que saem dos casulos sem medo do tempo,
Enfrentam tudo como se fossem viver eternamente
[vivem tão pouco]
Deveríamos viver assim,
sem o pavor da finitude
[Sem pensar]
Que duração terá nossa existência
Viver como os animais e suas pequenas lutas diárias
Sem esperança
Fazer o necessário
Até que tudo termine
Cómo deve ser
Como será.
*
Cíclico
Tudo é uma eterna repetição
De um passado inglório
De lutas perdidas
De injustiça.
A humanidade caminha em círculos
Não há avanço
Tampouco um novo caminho
Tudo parece novo
Mas é antigo
Os mesmos sentimentos
A mesma velha angústia
Viramos a esquina
Já sabemos o que nos espera
A ideia de novidade
É antiga
Esperamos por ela
Quase todos os dias
Quando não, por toda a vida.
*
Banquete
Muito foi dito
Nada concluído
Promessas jogadas no mangue
Os caranguejos comeram todas
Todos de barriga cheia
Eu ando no lodo
Busco alguma promessa perdida
Não sobrou nada
Ausência de palavras
Os caranguejos festejam
O banquete de mentiras que foi servido
Mal sabem o tamanho da indigestão
Se alimentaram de ilusão.