Quatro poemas de Leandro Durazzo
Leandro Durazzo é antropólogo e tradutor. Autor de Tripitaka (Ed. Medita, 2014), Cantos de Natal (Munganga Edições, 2017), Mar de Viração (Moinhos, 2018) e Karma (Pedregulho, 2023), entre outros, integrou a antologia de poesia contemporânea É Agora Como Nunca, organizada por Adriana Calcanhotto (Cia. das Letras/Cotovia, 2017).
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duvidar de si,
confiar no mundo.
uma árvore deste tamanho não se inventa
da noite pro dia, pensou,
olhando o cajueiro imenso.
duvidar de si,
confiar no mundo.
*
tanta coisa, sempre. O tempo todo.
DECA
os pavões comeram os brotos de mamoeiro.
Uma avó faleceu hoje cedo. Como sempre,
estou distante, mas acendo
uma vela no altar, um incenso, e saio a catar
folhas secas em torno da casa. Mosquitos me acossam
enquanto eu coço as pernas, pensando,
melhor, rastelando
sem muito pensar.
É fim de inverno, as plantas
morrem para nascer outra hora, em outros pés, outros
lugares. Rastelo as folhas caídas, sentindo o cheiro da grama
viva por sob tudo. Um sagüi se pendura no cajueiro,
mascando o sumo, comendo o fruto que ainda não.
Um bem-te-vi pousa perto, as folhas secas eu jogo
por cima da cerca, direto no matagal. Todo passado há de adubar,
todo presente há. Na ponta de um ramo seco
desponta uma folha verde. O ninho de passarinhos vive.
*
KARMA
mas alguma coisa acontece
no quando, agora
em mim. No canto da prateleira,
entre copos, duas aranhas se engalfinham.
Suponho que redes cruzadas, suponho
que a pequenina está sendo massacrada
pela aranha bem maior. Quem
caiu na rede de quem? O que faz a teia
quando o outro vem, o que faz a pata,
a garra, a gana? Alguma coisa acontece, e já
se inicia no primeiro fio, no primeiro
vento que sopra a aranha, no ovo da aranha,
no inseto que anima essa trama,
servindo de almoço. Alguma coisa,
tanta coisa, sempre. O tempo todo.
*
não há necessidade de pregar o mal:
ele já está
dependurado na parede, em toda sala, na altura
dos olhos mesmos que o olham. Não há
necessidade de olhar o mal
como quem concorda.
que o mundo é injusto,
que a vida é triste,
que a morte existe,
que o tempo é curto:
não há quem disso não saiba.
necessário é estar calado,
calmo, lendo
um poema, escrevendo
um poema, respondendo
num poema
a beleza que ergue o mundo
e a sutileza das palavras.
Divino Ângelo Rola
Maravilhosas poesias li aqui. Um projeto maravilhoso. Sou poeta e gostaria de saber o que fazer para ter meus poemas neste espaço.