Quatro poemas de Wellington Rafael
Nascido no último dia de outono de 1995, o poços-caldense Wellington Rafael é poeta, historiador e ator. Demonstrou interesse pela poesia logo na infância, começou a dar seus primeiros passos na escrita aos 12 anos e desde então não parou mais. Tendo como referência poetas como Mario Quintana, Ferreira Gullar e Guilherme de Almeida.
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Arqueologia
Brumadinho Brumadinho
Coberto de lama
Onde está a casa de
Dona Tereza que ficava
Perto do bar de seu Antônio?
Onde está seu Antônio?
Onde estão os bêbados que
Bebiam ritualisticamente
No bar de seu Antônio?
E Raquel e Gustavo que
Iriam se casar no fim
Do ano, onde estarão?
Cadê a carta que Maria
Estava indo enviar para
Mateus que está em São Paulo?
E os jovens que acabaram
De se conhecer e iriam
Se encontrar à noitinha
Na praça da cidade?
Procurem pelos poemas
De Leonardo que escrevia
Com tanto afinco seus versos.
Brumadinho Brumadinho
Um dia os arqueólogos
Os encontrarão…
*
Chuva De Sangue
É calor de mês de outubro.
Lá fora chove.
Aqui dentro, vertigem.
Uma cadela no cio
passa pela rua
e cães raivosos a segue
prontos para procriar…
C C C C C
H H H H H
O O O O O
V V V V V
E E E E E
um negro morto;
um gay espancado;
uma mulher marcada;
Medo medo.
Incerteza.
Lá fora chove.
Aqui dentro vertigem.
A história se repete.
Meu povo não nota.
Cegos à beira do abismo.
Um GRITO!
Medo medo MEDO!
E chove
C C C C C C
H H H H H H
O O O O O O
V R V R V R
E O E O E O
MORTE
Enxurrada de sangue.
Um cheiro pútrido…
__ Alguém morreu?
__ Mais um negro, ao que me parece.
__ Outra mulher espancada?
__ Sim. A coisa tá feia, mas a economia tá boa.
A cadela
deu
cria…
Seus filhotes tem dentes
afiados.
E como mordem.
Meu povo que morre.
Minha poesia que
sangra.
É calor de mês de outubro.
Lá fora chove
E meu país roda…
Vertiginoso.
*
Meus Meninos Da Rua
Os meninos da rua brincam.
Não se dão conta
do que acontece no mundo,
não se importam
com o que acontece no mundo.
Brincam. Jogam água
um no outro.
Gargalham.
Agora atiram pedras
para ver quem joga
mais alto.
Essa mania dos
meninos de medirem fantasia…
*
Poesia Quotidiana
O movimento da cidade.
Os carros, as pessoas…
Passam.
Não se veem.
Tudo segue.
O poeta atônito.
Essa vida quotidiana.
Poesia quotidiana.
A notícia impressa no jornal:
“Pais de bebê de três meses são
presos acusados de matar o filho.”
A situação crítica de seu João
que nasceu em 1956
e há 20 anos trabalha na
empresa de transporte público
com um salário que mal da
pra sobreviver.
Marília retorna para
casa após uma jornada
de 12 horas de trabalho.
O vai e vem urbano.
Pessoas sem olhos.
Pessoas sem boca.
Ruídos.
O cheiro de gasolina,
de diesel.
A fumaça.
A alta do dólar.
A crise política.
A dura poesia concreta
dos grandes centros…
a miséria.