Seis poemas de Vitor Mateus da Silva
Vitor Mateus da Silva tem 19 anos e reside em Santana de Parnaíba. Aprecia não somente ler poesia, mas também ouvi-la em saraus e slams, e foi através desses movimentos que surgiu seu interesse pela escrita de poemas e contos. Publicou pela primeira vez na antologia poética Candeeiros da editora Andross, com o poema Ideias tortas de um poeta desvairado, no ano de 2022. Por intermédio dessa publicação, foi indicado ao prêmio Strix da mesma editora, em 2023.
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esquecer quem se é nem se compara a esquecer o caminho de casa
casa é lugar de retorno
antes de tudo
eu sou minha própria casa
meu início
eu vim antes de tudo que conheço
só então consciência de tempo e lugar
eu sou o início de tudo
pra construir futuro é preciso saber de onde veio
memória é certeza de existir
quem sou eu sem um passado?
sem um antes, ontem, outrora, antevir
o que é um corpo sem nome?
uma mulher que não lembra de si, talvez ainda guarde no documento a memória que lhe falta
: um nome
um pai
uma mãe
um endereço
quem sabe
e números insignificantes que comportam um enorme vazio
de gente
PROCURA-SE
quem
já
foi
alguém
eu me procuro, me persigo, me encontro, me acho
nesse não sei quem sou
nesse talvez
nessa obra sem prazo
nessa construção de mim
derrubo paredes que limitam o ser e o existir
desenho na cabeça o caminho de casa
pra não me perder
de mim mesmo
ser alguém na vida é
se fazer em erros e defeitos
com possibilidade de recomeço
guardo na memória
número de telefone, e-mail, senha do banco, meu número de sapato e
nada absolutamente nada
que não me faça esquecer quem eu sou
eu sou dúvidas e indagações
eu sou meio e nunca final
eu sou caminho sem chegada
sou aluno, professor, matéria
corpo, carne, ossos,
mas
quem sou eu do lado de dentro da casca? do frasco? do recipiente?
eu ainda caibo em mim mesmo?
eu quero ser maior do que já fui
ser além de mim
me acrescentar
guardar na cabeça quem fui pra vir a ser
olhar pra quem veio antes
pra saber
que minha história não começou aqui
ancestralidade é identidade
sou continuidade de muita gente que já passou
e ficou
na memória guardo
Carolina, Abdias, Ruth, Marielle
levo comigo uma multidão
pra não esquecer
(re)existir é herança
eu sou fruto, filho
da luta
faço e escrevo história
e
não vou esquecer
não posso esquecer
posso ser
tudo tudo tudo
que quiser
pois
esse é só o começo de mim.
*
Marginal
Degustar o gosto azedo
das palavras resistir e lutar
se ver no mundo com tudo
que você tem e é
compreender os mecanismos excludentes
ser força de oposição a todas as forças
hegemônicas de opressão
seguir e
Ter de arrombar as portas
mostrar as cores de dentro
se dispôr ao risco da não aceitação
se encolher na concha
lidar com trincos e trancas,
seguir e
Caminhar pelas beiradas,
nas margens de tudo,
ouvir, falar e escrever sobre a margem
sobre os afastamentos, os esquecidos,
os abandonos e sofrimentos
seguir e
Exercer a autoestima,
lidar consigo e com o outro,
assistir e viver a violência,
ser as dores de ontem ainda hoje,
se fazer forte
seguir em frente e
*
Masculinidade
Cuidar das unhas
pintá-las
colocar uma roupa rosa choque
pôr anéis e pulseiras
usar de toda sorte de joias
adornos
alongar os cabelos
maquiar-se
Sentir-se um homem muito bonito.
*
Na praça a menina pobre
conheceu a miséria e o abandono
do Estado, dos visitantes
das ruas-casas que tinham de noitinha estrelas no teto
Era triste de ver tanta gente
(des)abrigada na estrada
crianças e adultos de toda idade
com fome de direito e lugar
No estranhamento das ideias da menina
como podia tanta gente assim peregrinar
de um lado a outro daquele lugar
sem ter o que comer
sem ter esperança pra sonhar
Ela, assustada conheceu o mundo que tinha vindo morar
onde uns tem tanto, muitos pouco e outros quase nada
senão a vida quase gasta.
*
Pergunto pra te ver do avesso
Qual seu poeta favorito?
Qual a trilha sonora de seus pensamentos?
O que você faz quando o amor explode?
O que te transborda e o que te falta?
A que hora o sol te convida pra exposição?
Como afetar o outro com palavra?
Como dizer “Eu te amo” no silêncio?
Como fotografar com o coração?
Como se embelezar por dentro?
Quanta gente pode caber no peito?
Quantos abraços são precisos pra exterminar a tristeza?
O que te recarrega depois do cansaço?
Como desaguar a dor?
*
No silêncio ouça o
corpo falar no
abraço embolado apertado
o afeto expressado compartilhado
e comunicar com o olhar
pensamento ideia telepatia
o sorriso o riso
o enlace entrelace
sem tela conexão
o toque na mão
embaraço laço
ligação união
amor romântico (ou não)
sentimento em movimentação
parceria na correria
tá perto no dia-a-dia
de dentro pra fora
o sentimento a sensação
um poema um carinho
afetação
cê sabe, meu bem
vale tudo quando amar
cê sabe, meu bem
vale tudo quando o coração falar.
ChiccoMello
Como faço pra vcs publicarem poemas meus?