Sete poemas de Irene de Souza Nunes
Irene de Souza Nunes, baiana de Guajeru, é Mestra em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (PPGED/UESB), Membro do Grupo de Pesquisa Núcleo de Análise em Memória Social, Espaço e Educação (NUAMSEE/CNPq), Especialista em Língua e Literatura e Gestão Educacional, Graduada em Letras pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Professora da Educação Básica.
E-mail:nnunesirene@gmail.com
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O luto tem cor?
Aparentemente parece cinzento
E dadas as sensações
Talvez o seja mesmo,
Sem cor…
E fica triste a vida.
Mas Deus pode:
Devolver o colorido,
Tornar os dias divertidos
Despertar o desejo que dorme
De ser e ter companhia
De servir, louvar, agradecer
Pelo retorno da alegria.
É preciso falar do luto
Primeiro passo para elaborá-lo
E sentar do lado
De quem com e por nós ora
E quando se vê vai pro ralo
A tristeza que quis fazer morada
Onde só Jesus mora: dentro de nós.
*
Sua Partida
Como dói!
Sinto ainda hoje as lembranças de outrora; constantes retrospectivas são feitas em minha Memória e como não é possível o caule se desligar da raiz, minha mente não se desliga do meu coração; meu viver não se desliga do passado… Não é possível descrever, tudo dói, revivo aquele momento, em que, entre lágrimas nos separamos, não podíamos mais nos tocar, nos unir, sinto tanto a sua falta! Culpa de quem? Amadurecida, me pergunto.
Minha não foi, eu te merecia… Pretensão minha? Você bem que podia ser maior ou eu podia ser menor? Por que não encontro respostas? Meu coração quer você perto de mim, meu corpo deseja você… Doce utopia! Arrisco-me culpar a “natureza” – tão doce e inofensiva nos parece, porém foi ela, foi ela quem nos fez separar. Eu preciso culpar alguém, eu preciso entender nossa separação. Ou foi alguém, um ser humano dócil, porém insatisfeito o qual não aceita a felicidade alheia.
Jamais revi você, só hoje me dou conta disso: era tão lindo, trajava-se de azul, sua pele era de uma maciez incomparável, nos dávamos tão bem, você se ajustava tão bem em mim, me apertava e eu me deliciava, eu me sentia nas nuvens, pois me encontrava dentro de você tão aconchegante…
Eh! A vida nos prega peças e de você eu tive que desfazer, jogar-te fora foi a sentença que recebi. Nem ao menos um pedaço de você, apenas lembranças que me martirizam: por que não volta pra mim? Por que não é possível nossa união? Eu não tenho coragem, confesso, de enfrentar a todos e tornar a ter você tão perto de mim, entre meus braços…
Hoje estou feliz, consigo encontrar respostas, sei que não vai voltar, pois não tenho coragem de lhe aceitar, porém é gostosa a dor, uma dor suportável, a dor da saudade, da lembrança do dia em que te joguei no fundo de uma gaveta, meu pequenino sutiã.
*
Expectativas X realidade
Quando me tornei professora
Minha companhia era a ilusão:
De que teria nas mãos
Apenas um trabalho remunerado.
Doce imaturidade!
Anos se passaram
Fui sendo pelas experiências, afetada
Coitada!
Caí na real.
Pude ver que naquele emprego
Empregava diariamente
Meus dons, minha inteireza,
Pois na minha mente
Lá estavam TODOS:
Meus alunos, os seus pais
A comunidade escolar
Minha cidade
A humanidade…
Cada aula preparada
Deveria contemplar
O gosto pelo encontro
E o desejo de retornar.
Foi ficando cada dia mais claro
O poder que eu tenho nas ‘mãos’:
De “matar” ou “salvar” pessoas
Por meio da Educação.
Assim aprendi que a profissão
Possui sua primazia
Tal qual o ser da medicina
Que cuida do corpo
E/ou a mente esvazia.
Ser professor não é diferente:
É preciso manter a EXPECTATIVA
Tratando o estudante integralmente
E transformar a REALIDADE.
*
A conta dos contos
Quem hoje faz conta dos contos?
Aquelas memoráveis narrativas
Parece não lhes haver espaço
Nesse universo acelerado
Ansioso por contar
Suas efêmeras vivências
Vejo um povo se encher de pressa
Vazio de experiências
E eis que a conta chega
E não há como não pagar
Ainda que se fique no vermelho
Ou parcele a perder de vista
De geração a geração
Vai-se gerando dívidas
Com a própria vida
Até o caos se instalar.
No fim das contas
Que falta faz o conto!
Ter lembranças para contar
Do tempo gasto sem reserva
Das experiências que nos tocam
Não tenha pressa!
Dê espaço para as memórias
Conte causos
Deixa de história…
Presta contas da tua existência!
*
Reciprocidade
Entre mim e você
Há uma ponte de estrelas
Enfeitada de plumas e paetês
Escapando de gaiolas vazias
Penduradas no silencioso jardim
Que doce é o cheiro do jasmim!
A lua agora está filmando
O gosto perfumado de liberdade
De quem decide, sem demora
Viver a verdade
Eis a hora!
Não se pergunte p’ra quando.
De uma lente lunar não escapa
Nem mesmo o rastro no ar
Somos pássaros rompendo prisões
Pelo doce sabor de viver
Fiquem abertas as gaiolas
Que revelam almas secretas
Plantadas no vazio do tempo
Ouça o silêncio!
Não fiquemos quietos.
*
O silêncio da música
Música é combinação
Harmonia
Sons de expressão.
Notas que vibram
E rompem o silêncio externo
Fazem ressoar os barulhos
E os medos internos:
Aquilo que se quer calar
Pois ninguém quer ver
Tampouco se dá a escutar
Nossos guardados
Parecem querer saltar
No mesmo ritmo
Num tom ora grave
Ora tão agudo
Que é quase palpável
A cadência que se dá
Entre a melodia
E o quê não se quer tocar.
A música silencia
Quando toca a alma
Emudece os sentidos
Desperta a memória
Transporta o pensamento
Na velocidade do vento
A música toca o profundo do eu
Remete ao passado
Faz sentir saudade
Até do que não se viveu
Qual terá sido
O propósito do homem,
Um ser sensível,
O inventor da música?
Desejava esse ouvir os sons da vida
Ou ativar a escuta de si?
Música é refúgio
Do mundo
É encontro consigo.
*
Amor próprio
O que seria de mim
Se eu em mim não habitasse?
Haveria um corpo vazio…
Vagando entre fendas humanas
E uma mente insana
Transporia o sopro da vida.
Quem me faria companhia
Nas horas mortas e sombrias?
Quando só, a mente vive para si
Corpo divaga e quer partir.
Onde será que eu estaria
Num estado de ação
Ou como fenômeno de alegria
Uma coisa é certa, eu sei:
Como se pode ao outro amar
Se de amor próprio não se armar?