Três poemas de Eron Rafael
Eron Rafael é natural de Porto Alegre e possui vinte e nove anos de idade. Ele é mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e atua como professor de Língua Portuguesa e literatura na rede estadual de ensino. Terrivelmente homossexual, Eron divulga seus textos no perfil @eronrafaels, no Instagram.
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O doce canto da sereia
Eu o vi pela janela correndo a rua
E a minha boca crua secou de desejo
Pelo corpo, pelas pernas, pelos cortes na canela
Que eu imaginava curar num beijo
E eu tentava lhe dizer num aceno
Pra que se controlar na espera?
Eu tenho um doce na minha cueca
Pronto pra te satisfazer
Toma um banho, e limpa os dentes
Vem pra zona do Ocidente
Vem beber cerveja quente
E aprender sobre o prazer
Eu o vi de novo deslizando o skate
E minha mão doente lhe fez um gracejo
Pra sentir seu corpo, seu torso, o suor do pescoço
Correndo em mim feito o rio Tejo
E eu tentava gritar em silêncio
Pra que se debater na espera?
O volume entre tuas pernas
Denuncia o teu querer
Vem sem roupa, vem pra noite
Se pendura nesse açougue
O teu pau feito um açoite,
Fazendo a terra tremer
Ah, mas vê-lo sem camisa
É como cocaína,
Dilata as narinas, coça a virilha e outras partes
E eu finjo que a tua mão é a minha
E circundo as linhas feito arte que me arde assim
Tão quente
Cê me entende ?
Pra que me torturar na espera?
Se o teu corpo já entrega
Essa vontade de me ter
Sente a dor que me incendeia
O doce canto da sereia
Implodindo em tuas veias
E implorando pra foder.
*
Timarco
Cala minha boca no mais feroz dos beijos
Beijo nas linhas do pescoço o cansaço
Mormaço espalha na cintura o latejo
Latejo e derreto no véu do espaço
Sangria da minha carne em glorioso anseio
Anseio tua palma na minha alma fria
Esfria a língua na pele em devaneio
Incendeio nas chamas que o teu ar suspira
Aperta minha nuca em prazeroso embate
Bate na minha carne tua paixão incerta
Espeta essa tua louca lança escarlate
As trevas, meu corpo, com força, invade
Entorpecido no seco e tinto vinho
Linho dos lençóis na pele em chamas
Chamas meu nome, rindo aos prantos
Brandos espinhos na dor do espasmo
Espaço cavas em fronteiras errantes
Avante à conquista de tuas terras
Enterra no meu corpo tua bandeira
Estreita meu corpo no teu corpo e berra
Guerra na tua alma que no uivo aflora
Jorra teu gozo e morre na luz o facho
Quem é teu macho?
Quem é teu macho agora?
*
Temporada de Caça
Um ar carregado se espalha pela calçada
A lua já cansada, entre as luzes da cidade que geme,
desenha seu esboço.
O corpo quente, o cheiro ocre de esgoto
Meninos virando o pescoço para acompanhar
o andar de meninos como eles
A cidade treme e os vidros embaça.
Começou a temporada de caça
As árvores abrem-se em flores pelas matas
A chuva lava o terreno e abre caminhos
e alimenta os brotos
O calor no ventre, a energia torpe do mofo
Homens sentem no osso a vontade por moços
tão homens quanto eles.
Os vizinhos mentem e invadem a praça
Começou a temporada de caça
O sol desponta no horizonte
E não há caminhos por onde
se possa se esquivar da primavera
O calor avança e liberta suas feras
para o ataque.
Garotos desesperados correndo para o abate
Que Deus proteja as nossas calças
Começou a temporada de caça