Três poemas de Fabio Ernesto – Revista Mal de Ojo e Tradução de Michelle Santos
Composição de grito
Esta é a terra escura que meu coração ama
Esta é a terra em que quero morrer.
Aurelio Arturo
Ontem à noite
Transbordado
Pelas comissuras
De minha boca
Um grito.
O agarrei pela pele
Do movimento
De suas variantes de vento
Coloquei um rosto nele
Para apresentar aos mortos,
Dei uma raíz
Para encaixá-lo
Na terra
Que me sustenta
Meu grito
Parou
Nos pedaços dos corações desabitados
Na fração
De tempo
Que dura
A vida
Durante a morte
Transmigração em um eu sustentado
Você levou
Minha borda de vegetais
Minhas rotinas de 5 da manhã
Do transporte urbano,
Minhas diligências
De amor
Tomando nome
Em cada parte,
Mina boca armada
Em Camilo Torres,
Meus versos lúbricos
Para Emilia Ayarza,
Meus gritos atestados
De magistrado
Do povo,
Minhas manhãs sem sexo
Nos dias de feriados,
Minhas tristezas
acolhidas
Pelo violão,
A melancolia
Que dirijo
às putas,
a inveja secreta
que tenho
do meu irmão,
meus delírios
de maleante
de ocultista,
de poeta,
da galeria da cidade
com gente bêbada.
Você levou
Meu lugar
Meu mostrou
Os dentes,
Vivi o amor;
Agora
Estou
Ferido.
Tribulações de viver inconforme
As pessoas
São pessoas
Porque suas pálpebras
transitam
ao fechar,
pelo aspecto
de figuras verticais
que estão
na terra.
As pessoas
São pessoas
Porque temem
Habitar como semente
Em perspectiva
Descendente,
Se encher
De raízes
Desde dentro,
Limpar
Seus ossos
Com vermes.
As pessoas
São pessoas
Porque carregam
A dor
Na pele,
O olhar caído
De lado
E o silêncio
Compacto
Da morte
Coberto
De membranas vegetais
Fabio Ernesto Martínez Maldonado (Bogotá, Colômbia, 1983). Poeta, Músico, compositor, Engenheiro Agrônomo – Fisiólogo de plantas (Universidad Nacional de Colombia), e (C) Ph.D. em Ciências (Universidade de São Paulo – Brasil). Publicou os poemários: las pasiones (2011) e Las Pasiones – Treistamentário (2012) (Ugp – Universidad Nacional de Colombia, projetos estudantis) em coautoria. Al final todo es retablo (Editora Piedra de Toque, Colômbia, 2019). Participou no livro de poesia Nuevo Sol (Editora Entre Pueblos, mexico, 2021). Sua obra mais recente é Geometrías de la tristeza (Editora Angeles de Papel, Perú, 2021). Cofundador e compositor principal dos grupos musicais latino-americanos Ayo é Monte, Defensa Colectivo e do projeto de música alternativa A Media Lengua.
Ser América Latina é acreditar que, para além de simples territórios e dos idiomas falados, há um povo que conta as suas histórias e resiste dia após dia às instabilidades econômicas/políticas e severos problemas sociais. E nessa resistência, engendra-se uma diversidade literária, que, assim como o povo, luta, se recria, ensina e nos encanta. Do político ao simples versar do cotidiano, aqui se unem e se cruzam as revistas Mal de Ojo e Ruído Manifesto para dar voz ao povo de uma América Latina que ainda precisa gritar por liberdade e fazer de suas paixões trincheira, repercutindo aos quatro cantos do mundo, por intermédio de textos singulares, a beleza e a contundência de seus desejos. Por aqui passarão escritos de poetas da Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia e Peru.
Uma curadoria de Hérnan Contreras R. e tradução de Michelle Santos.