Três poemas de Lírio Valente
Lírio Valente (Mogi das Cruzes, 1995) é poeta visual e performer, sua expressão desliza em diferentes mídias como a fotografia, a performance, o vídeo e instalação. Sua poética explora as intersecções entre palavra e o autorretrato, partindo da e expandindo a experiência do corpo erótico, sendo em particular, obras afloradas em questões de sexualidade, identidade e gênero.
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𝐌𝐎𝐑𝐃𝐀-𝐌𝐄
sem ter vergonha ou medo,
melaço da textura aos dedos,
encosta os lábios, suga-os
𝑚𝑒𝑢 𝑑𝑜𝑐𝑒 𝑣𝑎𝑚𝑝𝑖𝑟𝑜;
víbora-veneno-sangue-vivo.
Revirar dos olhos,
veloz-veloz-veloz;
a batizar meu nome:
P e r e c í v e l.
E, por quê?
Demora sobre a minha vulva; és
Sanguinária selva de lembrança, escorre;
voluptuosa [à]vida;
por guardar últimas e pequenas mortes.
Grita-te raivosa:
Te cavalgo. tento.
Fruta libidinosa.
Úmida-tênue.
Pegue minhas ancas,
Te prometo a vida de um poeta.
Palavras vivas, fonte h-éterea.
Ser poema que escorre a ponta d’língua;
Sós comigo.
Carrega-me da vertigem à fé.
Faz cruz aos braços enrolados aos cabelos;
Reza a prece baixo por meus seios.
Invada-me e te engulo, mulher-areia-movediça.
Sou convulsão do teu lobo-homem.
Urra feito lobo a chamar matilha;
Sou ferida perdida à tua boca;
Vampira.
Canção que cura indefinida;
Trilha à Éter.
Caos e Caligo.
Morda-me. Cíclica.
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I𝐍𝐓𝐈𝐌𝐈𝐃𝐀𝐃𝐄 𝐂𝐎𝐌 𝐀𝐌𝐎𝐑 É 𝐎𝐑𝐆𝐀𝐒𝐌𝐎
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No teu peito
Os dedos entre meus cabelos
Tua bússola aponta ao meu centro
Nos guia pelos lençóis da pequena morte.
Me escaldei em teu nome
Silibando entre “vem.. vem..”
E você?
Me tateia ao caminho
“Me passeia que eu gosto dessa sorte.”
Me prova, me enxerga, me cheira, me morde
Passo à passo, acertado
Acelerado, encaixado
Ao pé do ouvido.
E se deixa em mim,
Abraça todos meus sentidos,
Alívio, sexo, ombro-amigo.
E me vejo ali, bordada em tuas letras
A minha carne é de “aconteça!”
O “eu te amo” em textura umedecida,
Excita, instiga, revitaliza
Volúpia vira ciranda em ternura
E urra enquanto desliza;
Aos montes de vênus à cima!
*
𝐀𝐅𝐑𝐎𝐃𝐈𝐒𝐈𝐀𝐂𝐎
apoia teu corpo em meu ventre;
sorriso colado, teu doce frutado
gemido arfado entre os dentes.
olhares trocados, saliva banhada
sem redondilhas, pois, me precipito
barganha de amores não compreendidos.
finjo que sei dar nome ao que sinto,
extinto, instinto ou faminto?
lembro das águas demoradas,
que formavam castelo onde tu eras rei!
perdido no meu calabouço,
a pulsar em pronto: “coito?”.
dá-me o estalo delirante,
instante que pré-[acende] o amor.
o ar silente à luz, amando.
voz umedecida aos cânticos frêmitos:
eu quase vivo, eu tremo.