Três poemas de Lorraine Ramos Assis
Lorraine Ramos Assis (1996) é poeta, resenhista e editora. Publicada em diversas revistas e jornais, a exemplo de Vício Velho, Revista Ria, Torquato, Aboio e Relevo, também tem textos em Portugal e México. Colabora com a Revista Caliban, além de integrar a equipe de poetas do portal Faziapoesia. É socióloga, pesquisando a subalteridade em obras ficcionais femininas. Concedeu duas entrevistas ao canal Como eu escrevo.
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A cidade que não mais me surpreende
se encontra uma arcada
o que talvez se encontre
na verdade
é o molar de um sobrevivente
que mal se deslocava com as próprias pernas
você me disse
eu sempre cuidei de você
sempre a afaguei
sempre a instruí
e sempre a coloquei em incessante
dicotomia
na medida em que deslizava sob os destroços
o raio x dos ossos emitia um comunicado
dizendo
o metal está corroído
o anel dos dedos se diluiu
Pompeia se
destruiu
uma vez me falaram
a tendência do humano é o instinto de querer ficar perto dos demais
mas nas tragédias o desejo é salvar o próprio tecido da
pele
plenamente preservado
outro dia coloquei adornos em meu corpo
tatuado por labaredas
com objetos inúteis
sem valor de uso
fugitivos encontrados nas camadas
depósitos particulares erupções coluna gasosa
coluna
implodida
Pompeia, o lar de quem se encontrou na visualização de duas faces
pormenorizadas
mas de tamanha grandeza
a sufocando
equipe forense
realizando
o último
ato
análises posteriores do esqueleto a revelaram
com um papel trincado como os dentes de uma arcada
alguma razão
alguma teoria
algum leque de possibilidades
alguma coisa que seja
algo que falta
a parte que me falta
na verdade
para falar e não ser qualificada como a eterna engasgada
na própria estranheza
é o nosso posicionamento:
os dentes de leite surgem no trauma da primeira infância
*
Adeus ao companheiro do vício
Beleza, transparência ou verdade
Tornam-se o ruminar ao me quebrar na azulada
Apalpada, fatigada
E escorraçada cama.
Qual é o valor, na medida em que observo a
Correr
Duas fisionomias que
No ataque da cólera de um dos pares, quando
Ambos
Ao me escreverem em diários registram
Diagnóstico: Miocardite
Destruição do tecido muscular
E de um vestido dos anos 60
Peço perdão por mencionar a vulva
(Valor de troca nos músculos do fêmur,
Fluído a tecer em intervalos),
Mas me conduzo à linguagem de uma imagem
A me endurecer
E ao padrão orgânico urgido pelas minhas
Fronteiras.
Enquanto me atento aos olhos de quatro
Cadeiras
Muito bem posicionadas na frente
Começo a transpirar no novo ambiente
Consumido por baixa energia elétrica
Mas mesmo assim uma câmera insiste em me gravar
E me enoja
Digo
Estou no fim e
Inserido nele,
Me lanço
Como em um filme
Uma mulher não pode matar sem estar agasalhada por tesouras na garganta
De quem a fotografou
*
Primavera
a tarde, com sua dupla preocupação,
vozes entoando e uma miséria no transporte
ruiu do lado de fora da persiana
e quando menos se espera
percorre a lápide da megera.
há valor de culto no nosso solo,
tinindo
creditando infantes a modelos operacionais
arriscados;
um tigre, rugindo em pouca frequência
exala o odor dos verdes em brasas.
esses detalhes são importantes
e de vez em quando, armas de destruição em
massa
apontam para os nossos pés sujos mas
por um lado, chamam por faíscas
em cabelos embranquecidos
recorrem ao improvável
de um potencial esgotado
e entram em vertigem
(aumentam o ruído dos homens),
cumprimenta o especialista
o afogar de uma terra
por ora a luz não atinge
as lágrimas do baú de minha mãe