Três poemas de Marília Valengo
Marília Valengo. É de João Pessoa, capital da Paraíba, mas mora em NY, onde trabalha como Redatora e Designer de Joias. Costuma dizer que tem um pé no Cariri e outro no mar. É formada em Publicidade e Propaganda pelo Uniesp e Especialista em Escrita Criativa pela Unifor. Escreve desde que se lembra por gente em diários, cartas, blogs e, raramente, na sua newsletter “Relatos de Fauna e Flora”. Publicou poemas nas versões digital e impressa da Revista Subversa e lançou seu primeiro livro de poesia, Grito em Praça Vazia, pela Editora 7 Letras em 2020.
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Ainda em viagem
Da janela de um Corcel azul
uma criança olha para o mundo que passa
o que a paisagem poderá dizer?
Todas as plantas parecem seres estranhos
de um planeta que não existe
cujo legado se materializa em perguntas
Por que são ilhas?
Cadê o resto delas?
Será que existiam outras ou sempre foi assim?
Parecem meninas e meninos na escola
uns brincam juntos, outras sozinhas
e quem ela é, a criança que olha pela janela
uma Baraúna ou um Eucalipto?
Sempre achei fascinante adentrar
estradas rumo ao interior e pensar
um dia, ali naquele horizonte, em algum pequeno pedaço de terra
o homem pode nunca ter pisado
Foi por muito pouco que
a última árvore não desapareceu.
*
Relatório mensal
Sinto muita dor de coluna
os remédios vão tomando conta
tudo se resume a pílulas
talvez a Nasa seja mesmo tudo isso
que dizem
pra quê gastar tempo
com laranjas
se há vitamina C em cápsulas
de alta absorção?
mas uma coisa que a ciência
não inventa
é amor de mãe
a mão de uma mãe deslizando
por suas costas
a mão mais velha e mais magra
uma mão igual à sua
que mesmo frágil
não precisa de força
para dizer
deite
eu deito, mãe
mãe, mãe
cada desejo meu é uma ordem
marte é uma ordem
nosso marte em áries
deite e relaxe
ela trouxe água quente para meus pés
meus pés na água da minha mãe
como quando eu e ela
éramos uma só.
*
Segundo ato
Será que alguém pula
do penhasco
se na hora H
perguntam
tem certeza?
acho que ninguém aperta
o gatilho
se alguém grita
duvido!
uma mulher teimosa
até parece
estar mais viva que todo mundo
não se engane
existe uma diferença.