Três poemas de Tatiane Silva Santos
Tatiane Silva Santos é doutora em Educação pela Universidade de São Paulo e professora da Universidade do Estado de Mato Grosso. É autora de Pedras no telhado (Patuá, 2018), Tsurus (Quase Oito, 2020) e Mungunzá (Pallas, 2022). O livro Astroblema (no prelo) foi contemplado pelo Edital Estevão de Mendonça de Incentivo à Literatura Mato-grossense.
Os poemas abaixo compõem o livro Eu não estou contando essa história (Editora Penalux, 2023).
***
Lucille Clifton enxergou a poesia na raposa
Carolina Maria de Jesus em seus próprios dentes
a pequena menina que fui
em sua imagem ensolarada
nas águas
de um rio
morto
quando você está olhando
e a raposa
se movimenta
os dentes
se apertam
e a palavra
no peito
se rompe.
*
as linhas de Nazca
amanhecem em seu corpo
chamaram este continente destino
sem saber
que seu nome era rio
este que tanto sabe sua pele
um mapa
que você me assinala pelas manhãs.
*
tento contar novas histórias
para a criança que fui
a procuro nos sonhos
lá estou sempre com as chaves
da primeira casa em que vivi
vez ou outra
entro discretamente
para não chamar atenção dos vizinhos
e fico ali por um tempo para fugir
de tudo o que não me interessa lá fora
nestas minhas visitas secretas
minha chave sem dificuldade
sempre abre a antiga porta
os vizinhos não me enxergam
nunca estão na casa
os novos moradores
nem a criança que fui.