Três poemas de Thiago Rodrigues Carvalho
Thiago Rodrigues Carvalho. Um ente literário em busca de compreender seu real tamanho. Nos desencontros consigo mesmo, ocupa o cargo de professor para aprender com seus alunos, explorando múltiplas possibilidades de grafias da terra e do pensamento. Contaminado de chão, ele tem a mania de desprender o corpo na vibração do berimbau em rodas de Capoeira Angola. Usado por desvios, ele se espiritualiza com os ensinamentos da agricultura celestial e, por não saber, participa de feituras agroecológicas, estudando a abundância através das diferenças. Enfermo dos mundos que o cercam, as palavras se tornam sua farmácia e cura para as doenças que não saram. Por medo e insistência de amigos, seus escritos escapam, exigindo apresentações que não o explicam, mas implicam, de parte a parte.
***
LIXO
Resto
Rejeito
Sobra
Indício
Desperta
Coleta
Descuida
O vicio
Esperto
Contrário
Remédio
Pago
Estupro
calado
HOMEM
Rascunho
Avarento
De sobra
Recicla
Com a
Boca
Restos
emerge
gentes
farrapos
chorume
conta
mina
créditos
da fome
Vagabundo
Cativos
pagam
créditos
de
Carbono
Dor
cheira
Enxofre
no
monturo
dos
Esquecidos
Papelão
Casa de
Chão
Dorso
gelado
Lixo
Come
Boca
Fome
Lixo
Homem
*
Ponto sem nó
Entre duas retas perpendiculares
e paralelas há uma janela
lugar de encontro da vizinhança.
Olhos cruzados sonidos de transas
estrábicas
Aberta janela é ponto
que ainda em nó apodrece linhas
Costura vida amarga e frígida
Tem gente em nó atado de pele rasgada,
balas de estanho guerra estanque
Trincheiras farpadas de cadáveres inglórios
vencedores empodrecem túmulos
,
Nó luta competência alinhavada
vencida derrota
há volta
Linha de fuga me furta
passado ter sem vida
Paralelas não se cruzam
Porque a reta é sem frequência
No que Geo me usa metrigrafias
No que sou de chão metografias
Ponto preso disfere corpo
Indiferença comum despreza gente
Alinha verdade sacra tradição
História vencida sem relato do sangue
derramado chão
Luz descaminha
embranquecido passado escuro
Posse sem dono
forçado gosto de carne estuprada
podre-parto pátria-pardo
gentio
É no ponto que retomo
apreço da escrita vã em falha
Criação pela palavra
tramela sem trava janelas em trevas
nem porta sem casa
parede alinhada
Estica estiga
cerca cegam olhos
comem restos na margem recolhidas estrada
Alastro fogo armas brandas
rede pobre amarro vento
seleção dos menores roubos:
Como faixas no semáforo disfarçam fome infantil?
O ponto é feto e linha da puta que pariu
a reta
*
Perdido olhar
Não são fáceis os dias
em busca do olhar perdido na noite,
recordações borradas…
rosto beirando olhos
como fruto
agarra semente
desinente
Acordado sonho
Recaída insônia
Pétala de incerteza
Memória herança: rememorança
Toda desimportância
sentida no copo
flameja carne
Olhos nos olhos sorriam lábios,
marcas sujas paredes borradas
dilúvio deseja
Caminho
Desvio
Andar de dia
em imagens vagas
à espreita da noite
desencabada
Fulgurante retrato
da saia rodada
boca escapa
gira
mar à vista
maravilha
O corpo correndo ruas sem alma
sem nome rouba calma,
perturbador silêncio
ferida noturna
sangra
he-morra-dia
A surdez escuta
miragem rima
papel e caneta amordaçaram
o não da vida,
papel na tinta navalha ferida
Sentir desgovernado
sem significado
descativa boca
cala respiração
insaciável
Arredia imagem
da noite perene,
selvagem fugaz
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perdida no olhar