Uma minicrônica e dois poemas de Diego Roberto Silva Cavalcante
Diego Roberto Silva Cavalcante. “Sou estudante de Cinema e Audiovisual na Universidade Federal de Mato Grosso. Pesquisador sobre memórias invisibilizadas no cinema, com recorte do cinema LGBTQIA+ negro. É animador, roteirista, diretor e escritor”.
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Relatos selvagens de um viado silvestre
Nos tratam feitos bichos, só porque somos bichas, ora quanta ironia. Esses caçadores
apontam suas armas como se fossemos veados; bichas prontas para o abate.
Só que antes de matar, eles querem mesmo é nos comer.
Essa gente leva a sério o lance da cadeia produtiva. Esbravejam em largos pulmões: “Somos seres héterotróficos” – é o que dizem; e eu, bicha que sou, desconfio. Pois continuam a nos comer. Alimentar a si e matar os meus – Cervos e veados. Seguem assassinando a nossa alma. Por isso faleço toda vez que clamo a ti, ó mãe natureza.
No silêncio da mata, eles nos dizimam. Somos oferta profana de um deus violento. E nessa dança, alimentam seus desejos mais covardes. Saciam a fome de dominar o oprimido. Me ouve, ó natureza?
Se pertencemos ao mesmo reino, então por que a nossa espécie não pode reinar? Avisam a todos que somos cervos e não servos. Veado bicha. Coroado de luta. Nossa coroa é de sangue. A lantejoula é o luxo. É resistência. Avisa a todos que resistimos aos caçadores covardes. Avisa que veado morto não é alimento, é vida.
*
CEU: um verdadeiro inferno
Meu ceu, seu ceu
Nosso inferno
Um verão sem sol
Um verdadeiro inverno
Onde moras?
Me perguntam
Onde os anjos não cantam
Respondo sendo sincero
É riso, é choro
É finito, é eterno
Queria que os anjos cantassem
Não que o demônio fosse fraterno
*
MAS
mas virou conjunção do branco
mas, porém, todavia, entretanto
pretin gostoso, mas…
sorriso maluco, sagaz…
sexo selvagem, verás…
sujeito incrível, rapaz…
afeto lhe dou, atrás…
conjunções que marcam relações
mas, porém, todavia
liga orações
a deus eu peço afeto, mas…
afeto é feto
é feito de objeto ereto
afeto é prêmio; é bilhete
é sorte pra branco
é refugo pro negro