Embrulho de Natal – 1 – Por Carla Cunha
Na coluna mensal “Teia Labirinto”, Carla Cunha escreve sobre Literatura Erótica e Pornográfica. O nome da coluna nos remete à trama e aos caminhos enrodilhados que todos nós enfrentamos ao pensar na própria sexualidade. Nessa trajetória, pontos se conectam e produzem uma teia de informações sobre quem somos. Porém, às vezes, não encontramos o caminho e a sensação é como se estivéssemos num Labirinto.
Carla Cunha é paulista, escritora de Literatura Erótica e Pornográfica, mantém um blog com textos sobre o tema e em 2019 lançou Vermelho Infinito.
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Embrulho de Natal – 1
Não sei se contei dos presentes de Natal que troquei com o Quipa. Sim, passamos juntos, mas preciso dizer que isto não significa nada, ainda estamos naquela fase de cada um na sua, sem compromisso. É importante deixar claro, o que temos aqui é o Natal pandemia, passar com quem está por perto e não correr risco por aí. É verdade que fiquei atraída pela festa clandestina numa cobertura na Avenida Faria Lima. Luiza, minha ex, disse que rolaria até banda ao vivo. Não sei como o povo consegue tal nível de organização. Enfim, já combinei com o Quipa e, inclusive, consegui comprar os presentes online no site da Lolli Sexshops, com promessa de entrega antes das vinte e quatro horas. Dizem que é o melhor site de produtos pornográficos do Brasil. Acredito! A variedade de artigos foge a imaginação. Fiquei louca, passei valor assustador no cartão, comprei vibrador três velocidades, três tamanhos, três pontos. Nossa! Gastei, mas gastei com prazer. Para o Quipa, comprei bomba peniana. O anúncio diz, “o pênis poderá aumentar significativamente”, uhuuu. Se bem que o pau do Quipa é considerável, mas sempre é bom estimular o desejo no homem do pau agigantado. Enfim, comprei vibrador em gel, masturbador elétrico, chicote, coleira, lingerie, fantasia de coelha, com rabo e orelha peluda, e, o principal, a fantasia da rena do Papai Noel. Sim, iria esperar o Quipa vestida de rena para a ceia de Natal. Enfim, passei o cartão sem olhar o valor, os artigos chegaram no mesmo dia no final da tarde. Enrolei todos os presentes com papel laminado vermelho, escrevi bilhetinhos sensuais para todas as embalagens, com instruções de uso, colocando-me à disposição para cada cena criada.
Encomendei a ceia de Natal, vinho tinto, incensos de almíscar, doces e um bolo de chocolate. Nada como um delivery, com tudo disponível na ponta do dedo, sem se envolver em nada de verdade. Para quem disse que o mundo iria mudar, que nada, ficou mais caro e mais prático, e as pessoas fechadas em suas casas, preocupadas com elas mesmas. Agora, que fique bem claro, nunca disse que iria mudar, mesmo porque, sei bem que ninguém iria se tornar muito melhor. Eu continuo com a mesma filosofia, transar adoidada e colecionar o maior número de orgasmos possíveis, antes do mundo acabar.
Seja como for, por volta das seis horas da tarde, liguei para Quipa e disse que o jantar já estava pronto. Enfatizei o meu trabalho para organizar tudo, inclusive, a escolha dos presentes. Melhor avisar para ele não chegar de mão vazia e me causar frustração. Ele disse que tinha um presentinho de Natal para mim, fiquei animada, embora nunca me passaria na cabeça o que ele aprontaria.
Tomei banho demorado, daqueles que vamos mudando a pele e virando outra coisa e essa outra coisa nunca se sabe ao certo o que é, mas sempre uma espécie de desejo indecifrável. Nunca se sabe o que irá acontecer de sexual e louco.
20h no relógio e Quipa toca a companhia. De camisa vermelha e calça preta, imaginei que era o próprio Papai Noel vindo passar o Natal comigo. Decerto, havia cancelado a entrega de presentes e estava ali todinho para mim. Incrível! Enfim, ele entrou, trazia mais uma garrafa de vinho e uma sacola grande rosa, enfeitada com uma fita com meu nome. Pensei comigo, aqui o melhor Natal da minha vida, longe das tias fofoqueiras, longe das formalidades familiares, longe de todo o mundo em colapso. Quipa e eu, na noite natalina, de estrelas e cometas, para celebrar nossa existência.
Comemos com alegria. Brindes, elogios, risadas. A noite de um casal feliz, só que não. O sexo tem a ilusão de nos fazer acreditar nos encontros perfeitos, mas a coisa é bem mais complexa que a gente imagina. O fato é que precisamos agradecer por encontrar a mesma sintonia e entrar na mesma frequência nem que seja por essa noite.
Depois do jantar, quis dar os presentes de Natal de Quipa. Queria muito ver a reação dele com todas as possibilidades sexuais que eu, a mulher mais fantástica do mundo, proporcionava para ele. Ali tive orgasmos múltiplos em ver a carinha de Quipa a cada rasgada de papel e encontrar a surpresa brincadeira para aquela noite. Mágico. Imaginava ele voraz, com o chicote na mão me submetendo as mais loucas submissões eróticas. Obrigada, Papai Noel! hahahaha.
Quipa também me deu o presente, a tal sacola rosa e isso foi excitante. Finalmente, um presente de Natal dado pelo Quipa. Abri com cuidado, fui vendo aos poucos o que se apresentava a mim. Ele parecia nervoso, com um riso esquisitinho no canto da boca. Enfim, quando trouxe o presente a luz, vi que se tratava de uma cinta caralho e foi assim que terminamos o nosso 2020. Eu não tão submissa e ele não tão voraz.
(Capa: Frida Castelli).