Sua Majestade Chico Gil – Por Aline Wendpap
Na coluna mensal “Sonora”, Aline Wendpap escreve sobre cinema e audiovisual, dedicando-se principalmente a tessitura de textos críticos, com ênfase na produção mato-grossense, nacional ou ainda latino-americana. O título da coluna visa brincar com a palavra, que tanto é ruído, quanto pode ser uma conversa ou um som bacana. Não deixa de ser uma homenagem ao som, característica vigorosa do cinema, além de se parecer foneticamente com Serena, nome de sua bebê. A coluna irá ao ar sempre no último domingo do mês.
Aline Wendpap é cuiabana “de tchapa e cruz”, nascida em 1983. Primeira Doutora em Estudos de Cultura Contemporânea pelo PPGECCO da UFMT, Mestre em Educação pela mesma Universidade, Bacharel em Comunicação Social – Habilitação: Radialismo (UFMT), integrou o Parágrafo Cerrado, coletivo dedicado a leituras de cenas de espetáculos. É autora do livro A Televisão sob olhar das crianças cuiabanas (2008, EdUFMT).
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Sua Majestade Chico Gil
(Dir. Lidiane Barros. 2022 ‧ Documentário ‧ 27m 37s, YouTube[1])
Uma história ímpar de reinado em Mato Grosso, talvez essa seja uma boa descrição para a história retratada por Lidiane Barros no documentário “Sua Majestade Chico Gil”, que retrata, a partir de relatos de pessoas que o conheceram, um pouco do “reinado”, do ícone da cultura mato-grossense e grande responsável pelo ritmo que hoje conhecemos como Lambadão, o cantor e compositor Chico Gil.
Após ser alvo de estudos e pesquisas dentro da universidade, o gênio, como definido por alguns que o conheceram, torna-se agora também “Mestre da Cultura”[2], sendo homenageado em forma de livro e filme, o qual é alvo destas linhas.
O filme é bem estruturado e a forma como Lidiane escolheu contar a história é dinâmica e envolvente, pois não se detém em depoimentos longos e maçantes, como acontece com inúmeros documentários. Os ângulos e enquadramentos dos personagens, apesar de tradicionais, com a maioria dos entrevistados sentados, transmite conforto ao público e uma boa qualidade da fotografia, já que os cenários de fundo são desfocados. Quem responde por isso conjuntamente são: Protásio de Morais e Rosano Mauro Jr.
Isso se deve, em muito, pela edição assinada por Joana Castro, jovem editora que imprime personalidade, pitadas de humor e inclusive estabelece jogos retóricos entre os personagens, expondo algumas contradições ou conflitos de interesses. Foi muito ovacionada, por exemplo, as cenas em que um entrevistado diz que Chico nunca teve banda e outro rebate energicamente, dizendo que ele teve banda SIM! Além do fato de misturar imagens originalmente de VHS com as digitais.
Quanto a montagem é preciso destacar que, assim como se tem um início leve e descontraído, o final trágico e dramático também é muito bem construído, fato que se deve pela condução da trilha sonora, que inicia no alto, com músicas empolgantes e muito ritmadas e finaliza com a última composição dele “Amor de Lambadão”, bem mais lenta e quando misturada com as falas dá o tom da tragédia…
O linguajar é algo à parte. Pois, para os cuiabanos, como eu, é uma delícia ouvir todas essas entonações e “djeitos” de falar. Mas fiquei pensando que faltou legendar o filme, já que o nosso modo de falar é muito particular e por vezes difícil de compreender pelo público externo, sobretudo quando há pessoas que falam muito rápido, tais como a dançarina Daiana Emília.
Uma produção que vale muito a pena de se ver, primeiro pela história, segundo pelo próprio produto audiovisual e terceiro pelo ritmo que contagia! Visto que Chico Gil talvez tenha sido um dos primeiros artistas, senão o mais representativo a unir vários tribos, tanto que, na apresentação de lançamento do filme no CineTeatro Cuiabá, em julho de 2022, o tom foi dado pelo artista Paulo Monarco e Banda, com direito a rearranjo das músicas e pedido de bis pela plateia. Vamos torcer para que essa equipe continue produzindo, para termos ainda mais produtos como este para apreciar.
[1] Disponível em: Sua Majestade Chico Gil – YouTube
[2] Título proferido pela SECEL – MT – Secretaria Estadual de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso, possibilitado pelas Leis Aldir Blanc.