Entrevista com o escritor Jessé Andarilho #PassouPelaFLIPEBA
Em setembro, nos dias 22, 23 e 24, ocorreu a I Festa Literária na Ilha de Boipeba – FLIPEBA. Festa que buscou divulgar e fortalecer a celebração da literatura, das histórias e da identidade cultural que se cruzam e perpassam a ilha, que está para além da imensidão azul. A FLIPEBA nos três dias de evento reuniu diversos escritores, artistas e apreciadores de literatura, tanto da ilha – os nativos – como convidados, além de turistas de outros países, como Portugal, Argentina, Espanha.
Na sexta-feira, 24/09, ocorreu às 20h30 horas na Praça Principal de Boipeba, a mesa literária “Literatura é resistência” que contou com a mediação de Manoela Ramos e participação de Midiã Noelle, Hamilton Borges, Odara Fernando e Jessé Andarilho, que puderam conversar mais a respeito sobre como a literatura exerce para além de uma função de resistência.
Na coluna “Nas águas literárias da FLIPEBA” a colunista Nina Maria conversou um pouco com Jessé Andarilho acerca da sua atuação literária. Segue abaixo as quatro perguntas feita por Nina Maria à Jessé Andarilho.
Quem é Jessé Andarilho?
Escritor , roteirista , presidente do Centro Revolucionário de Inovação e Arte ( Cria ) e criador do projeto marginow. 3 livros publicados e participação em mais de 20 coletâneas.
Em 2020 foi um dos colunistas dos Diários do isolamento, parte do projeto Leia em Casa da Companhia das Letras e também teve sua história narrada na coleção Cabeças da Periferia com o livro: A escrita, a cultura e o território (Ed . Cobogó).
Em 2015, criou a marca Marginow que ganhou o mundo e ultrapassou fronteiras: nasceu na favela de Antares ( RJ ), mas já marcou presença em diversos estados brasileiros. Seu empreendedorismo o fez alçar vôos mais longos. Hoje, a marca possui projetos de audiovisual ( Poesia Marginow em 1 minuto ), Sarau itinerante ( não só em território nacional , como também em Nova York e Bologna / Itália ), e virou uma marca de produtos voltados para seu público – alvo.
Jessé Andarilho realiza palestras motivacionais em todo o Brasil , contando um pouco da sua história e mostrando como sua vida foi transformada por meio da literatura.
Nina Maria pergunta a Jessé Andarilho: Quem é Jessé Andarilho e quais suas nuances? E como o jessé se encontra com a Literatura? Me conta mais um pouco sobre o Jessé escritor e o Jessé roteirista
R – Jessé Andarilho é um cara de 40 anos, escritor, se descobriu o leitor aos 24 anos e depois disso não parou mais de ler. De tanto ler livros relatando a sua realidade, percebeu que eu poderia contar as histórias, e, a partir disso, começou a escrever. Até que um momento pensou que se queria viver do livro tinha que viver para o livro, depois disso todas as ações que fazia e que eu faz na sua vida são voltadas e direcionadas para a área da literatura, para a área do livro. É pai de três filhos Davi de 14 Giovana de 12 e Arthur de 1 ano e 8 meses. O Jessé escritor e o Jessé roteirista. O Jessé escritor é o Jessé que junta as histórias que vê, que vivem, que ouve, que permeiam a realidade na qual vive, junto e sas palavras e jogo para textos que vão ser publicados através de livros. E Jessé roteirista é a mesma coisa, só que só muda o formato de escrever né. A forma que se escreve do roteiro é diferente do que se escreve do livro, mas é só a mesma pessoa vida louca que faz uma loucura para incentivar a leitura, que inventa a batalha de rima, que inventa sarau, que inventa SLAM, que agita a cena para incentivar a leitura que inventar cena cultural no bairro onde eu vivo, na favela onde eu morei. E essas histórias acabam muito delas indo parar em texto e outras que vão para roteiro.
NM – Jessé, você é presidente do Centro Revolucionário de Inovação e Arte, o CRIA, e criador do projeto Marginow. Conta mais um pouco sobre o CRIA e o Marginow
R – O CRIA surgiu, na época, quando a gente estava querendo agitar alguns projetos culturais e sociais lá em Antares e a gente se deparou com a burocracia. Pensando nisso, eu e mais três amigos nos juntamos e montamos o CRIA, que é o centro revolucionário de inovação e arte. Só que como a gente achou que era só fazer o CNPJ e os projetos iria começar a acontecer, na verdade não, a gente ralou para caramba. A gente não conseguiu ganhar nenhum edital, ganhar nenhum recurso e acabou né com a vida adulta cada um teve que seguir seu caminho, cada um tem sua família e precisa de grana e a galera meio que se afastou isso indo lá para 2012 mais ou menos. Em 2014, depois que eu lancei meu primeiro livro, decidi criar o projeto chamado Marginow, que é da margem por agora. Só que Marginaw era só uma ideia, uma ideia de trazer para perto né, a ideia de um puxar o outro, aquela coisa de ninguém só tomar um de ninguém. O Marginow é todo mundo puxa a mão de todo mundo e traz, saca?!. A ideia é que é mídia de um fortalecer o outro, de uma mina, de mano sempre um fortalecendo outro e outro fortalecendo um. E aí em 2019 quando a gente começou a fazer um filme lá em Antares com Xamã, aí eu percebi que um posto policial desativado em Antes. Aí eu decidi invadir o espaço e ocupar transformando numa biblioteca comunitária. E essa biblioteca também passou a ser assédio não CRIA e do Marginow que virou uma coisa só né. O CNPJ do Marginow e agora eu tô vendo como advogado, com o meu contador de transformar o cria e o marginow no instituto marginow e a gente está nesse processo agora.
NM – O Projeto Marginow é uma biblioteca comunitária criada no antigo posto policial da Favela Antares. Quando você viu essa necessidade de criar uma biblioteca num antigo espaço da policial, o porquê dessa criação e qual a principal mensagem que você deseja passar para aqueles que podem ajudar o projeto. E claro, conta como podemos ajudar.
R – Então aí o marginow o projeto marginal eu falei acima como surgiu com a ideia de quem tá na margem e para o now,e quem tá no now, que é o agora em inglês, puxa quem tá na margem. Eu vi uma oportunidade do espaço lá desativado, o posto policial, e quis ocupar, já aqui em Antares, a favela em que eu nasci não tem nenhum espaço cultural, Santa Cruz que é o bairro vizinho não tem cinema, não tem teatro. Então é uma forma que eu encontrei de levar o espaço para as pessoas se manifestarem as suas artes ali na região.
NM – Sua história de vida já foi narrada na coleção Cabeças da Periferia através do livro A escrita, a cultura e o território pela editora Cobogó. Como o jessé se encontra com a escrita e a literatura e se tornar esse grande exemplo para a periferia?
R – Como eu falei, li um livro, achei que era maneiro depois desse livro comecei a comprar outros livros que falava de favela e aí o resto foi consequência né. Ás vezes não se define uma história da pessoa em palavras por frases com respostas a questionamentos e perguntas. A vida é isso aí, é passo a passo, palavra por palavra. Palavra por palavra tô escrevendo minha história, escrevendo meus livros e aqui estou jogando mais palavras aqui para você, e você vai jogar essas palavras para outras pessoas, e outras pessoas vão reverberar para outras pessoas e assim vai ser assim vai ser construindo nessa cultura né, da cultura da literatura que a palavra por palavra, da literatura marginal que é a palavra rabiscada no muro, palavra cantada nos rap, palavras escrita em livros.
NM – Sobre o seu lado voltado ao audiovisual, o Marginow possui um projeto chamado Poesia Marginow em 1 minuto, que leva a participação de vários nomes do campo da literatura marginal cujo são exemplos para a favela, como Mano Brown, MV Bill, Djonga, BK, Rincon Sapiência, dentre outros. Como surgiu essa ideia de atrelar a literatura ao audiovisual de 1 minuto, trazendo desde grandes nomes, como aqueles que estão surgindo nesse meio literário, que por vezes é marginalizado, assim como também pessoas de mais idade?
R – Eu achava livro chato quando era mais novo e muitas pessoas da minha idade que eu tinha no passado também acha livro chato. Então quando eu comecei a visitar a escola, e falava de poesias, as pessoas falava que poesia era uma coisa chata e aí eu explicava que o rap, que a galera curtia era ritmo de poesia, mas eu não conseguia fazer as pessoas assimilarem 100%. Eu tive a ideia de começar a gravar a galera do rap de outras artes, pagode, galera da tv, de cinema e poesia de um minuto, poesias autorais de um minuto para exibir nas escolas e mostrar que poesia é uma parada legal. E assim comecei a utilizar um pouco do processo do audiovisual, que eu aprendi há muito tempo, trabalhei como e produtor do programa de televisão com o MV Bill. Eu utilizei essas minhas técnicas de audiovisual misturando com a literatura com a poesia para jogar lá no canal do Marginow né, mas com propósito de mostrar pra galera que poesia é uma parada legal.
NM – Falar de Poesia Marginow é falar de inclusão de gênero, racial, LGBTQIA+, etária e PCD? E como a Poesia Marginow combate aos diversos preconceitos existentes na sociedade brasileira?
R – É falar de inclusão sim. É cara, falar de inclusão de gênero. É o que a gente queria fazer não era dar voz, mas ampliar essas vozes. Jogando no canal, no mesmo lugar, onde tem um vídeo do Mano Brown ter dá Roberta Estrela Dalva, da Meg bee saca?! Do João, um menino negro do colégio público no Rio de janeiro que fez sua primeira poesia para gravar no canal, da Pamela Castro quer uma grafiteira internacionalmente. Então a nossa ideia era pegar vozes famosas e vozes não famosas jogar tudo no mesmo lugar bater no liquidificador e transformar em poesia marginal.
NM – O jessé escritor, roteirista e criador de projetos, também é palestrante, participando de eventos motivacionais em todo Brasil. Conta como a literatura mudou a sua vida e o porquê reverberar essa história.
R – Reverberar porque tem que reverberar né cara. Ninguém chega a lugar algum sozinho. Quanto mais pessoas tiverem dividindo seus conhecimentos, mais teremos um mundo melhor. Sendo que eu até recebo para fazer a maioria dessas palestras, esse ai é meu trampo. Não tem muita explicação, é uma parada que a gente tem que trocar essas ideias com todo mundo. Você não tem que ser só palco ou só plateia, tem que ser um pouco dos dois, um pouco de palco e um pouco de plateia. Assim como vou para eventos para ouvir pessoas fazendo palestras, eu sou curador de um evento chamando TEDxlaçador, que é um encontro de palestrantes em Porto Alegre. Eu vou para ouvir, eu vou para dar palestra, tô no palco, então a vida é uma troca.
NM – Jessé, deixa uma mensagem motivacional para aqueles que querem seguir o mesmo caminho que o seu, adentrar no mundo do audiovisual e fazendo florescer em literatura marginow.
R – Acredita no seu bagulho, o sucesso virá com o tempo. Palavra por palavra vai construindo sua história, um passo de cada vez não adianta sair correndo. E é isso mira e bota, escolhe um lugar onde você quer chegar e a cada dia da sua vida você dá um passo, você escreve uma palavra na direção do destino que você almeja. Palavra por palavra, passo a passo. É isso aí vamos que vamos é nois.